Quando se observa uma jornada de sucesso, é natural que uma série de percalços estejam no pacote. No caso do maranhense Vicente Carvalho, criador da página Razões para Acreditar – que compartilha boas notícias – e da plataforma VOAA (que significa “vaquinha online com amor e afeto”), os obstáculos foram desde ter saído de Rondônia, onde morava, para estudar em São Paulo sem conhecer nada nem ninguém da metrópole, até lançar algo que não deu tão certo. Mas tudo serviu de aprendizado, como ele mesmo contou em bate-papo conduzido pelo gerente de operação da Ambev, Dagoberto Mendonça, durante o evento virtual Super Week, promovido pela Fundação Estudar (da qual o Na Prática é uma das iniciativas) e exclusivo para participantes dos cursos da organização.
A “cara de pau” é fundamental
O empreendedor foi o primeiro convidado do encontro online da semana cujas conversas abordam diferentes superpoderes, sendo a resiliência o tema de estreia. A palavra, definida pelo apresentador como sendo “a habilidade de resolver mais buchas do que outras pessoas”, é encarada pelo empreendedor como “cara de pau” – que, aliás, ele precisou ter para batalhar por conta própria por seus objetivos. “Só sou o que sou porque meus pais não me deram tudo o que eu queria, por não terem ou não poderem, ou porque eles achavam que eu não precisaria, mesmo”, conta.
Isso passa, por exemplo, por ter juntado dinheiro para estudar em São Paulo, morado em uma região perigosa da cidade para conseguir pagar os estudos, abraçado uma vaga de estágio mesmo depois de formado (em Publicidade e Propaganda) e passa, ainda, por ter se oferecido para ser professor substituto na pós que fazia em Design Industrial. O resultado foi ter se tornado docente aos 24 anos, sendo ele o mais novo da turma toda em sala de aula. Mas o poder da resiliência, para Vicente, também está no verbo que dá nome a sua página: acreditar. “Desde muito pequeno, sempre imaginei que as coisas poderiam dar certo, não por uma crença em algo que eu não tenha controle, mas por achar que é mais fácil pensar que as coisas podem dar certo do que ficar pensando nas possibilidades de dar errado.”
Heróis são proativos
A origem da plataforma que divulga boas iniciativas foi em 2012, segundo o idealizador, quando ele comentou o post de uma amiga no Facebook dizendo que existem “razões para acreditar”. A partir dali, o propósito ficou claro e bastava tirar do papel. “O propósito era simples: mostrar que tem mais coisas boas acontecendo do que a gente recebe da mídia. As histórias mais simples sempre foram as que mais me encantaram: de alguém que ajudou uma pessoa a atravessar a rua, ou ajudou uma pessoa em situação de rua. Pequenas atitudes são as que fazem a diferença.”
O publicitário passou, então, a se dedicar em observar as ações daqueles que ajudavam, escrevendo as histórias que queria contar sempre com destaque para quem teve a iniciativa – o herói –, e não para quem foi beneficiado por ela. Vem daí um segundo sinônimo de resiliência para Vicente: a proatividade. “Alguém que faz um caixote para uma senhora atravessar a rua (por exemplo) tem atitude proativa, portanto, é resiliente”
Resiliência na pandemia
“Seja um solucionador de coisas, não um ‘empatador’ de problemas”
Não é segredo para ninguém que a crise sanitária tem exigido muito de todos, mas Vicente reforça que, do ponto de vista do empreendedorismo, houve negócios que avançaram como nunca antes: de gigantes como a Amazon até os pequenos empreendedores que vendem produtos pelo Whatsapp, “os negócios que já tinham sua estrutura 100% digital simplesmente decolaram”, diz ele.
A mudança reflete a importância crucial da tecnologia na pandemia, sendo responsável pelos novos modelos de trabalho. O mundo conectado traz outra lição, que também está ligada à inteligência emocional, na visão do empreendedor: parar de terceirizar responsabilidades. Isso porque, segundo ele, pela rapidez com que podemos pesquisar e obter informações em sites de busca, por exemplo, não faz sentido ficar esperando por respostas dos outros. “Seja útil, um solucionador de coisas, não um ‘empatador’ de problemas”, aconselha.
Salvar o mundo sem antes se ajudar é inviável
O pensamento que o ajuda a resolver questões sem esperar auxílio externo é o de que ninguém lhe deve nada. Por outro lado, o fato de ser “solucionador” não significa resolver toda e qualquer demanda. O perfil no Instagram da Razões para Acreditar, por exemplo, tem quase 3 milhões de seguidores, mas no número expressivo também há muitos haters e pedidos de ajuda de que Vicente e sua equipe não conseguem dar conta. “A gente não tem como contar todas as histórias, nem criar todas as vaquinhas que nos pedem”, comenta o empreendedor. Além de ter sempre em mente a máxima de que é impossível agradar a todos, Vicente lembra que, antes de dar apoio externo – que faz parte do dia a dia dos negócios sociais e organizações não governamentais –, é fundamental se ajudar. “Não adianta tentar solucionar os problemas do mundo, se os nossos estão em frangalhos.”
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Sobre não ter medo de temer
“Ser resiliente é saber que os medos fazem parte da vida, mas que a gente estará com eles mesmo assim”
O superpoder da resiliência tem a ver com o equilíbrio entre o racional e o emocional, mas não vem sem medo. Pela experiência do criador da Razões para Acreditar, o sentimento faz parte de fazer algo novo, mas a insegurança não pode atrapalhar o foco na parte prática do processo. “No início do negócio eu não tinha o que temer, porque não tinha faturamento. O máximo que poderia acontecer era não dar certo. O que eu pensava era que as pessoas precisavam conhecer as histórias e todo dia eu precisava publicar. Inevitavelmente eu publicava de 6 a 7 matérias por dia. Não tinha tempo de saber se ia dar certo ou não, só estava lá publicando”, conta.
Antes de criar a própria plataforma de arrecadações – a VOAA –, que funciona como geradora de boas notícias, Vicente e sua equipe chegaram a fazer uma coleção de camisetas, mas a iniciativa não deu certo, porque não era aquilo que o público da Razões queria. E tudo bem, porque, apesar do receio em fracassar, a experiência serviu de aprendizado para entender o que fazia mais sentido. “Ser resiliente é saber que os medos fazem parte da vida, mas a gente estará com eles mesmo assim”.
Confira as outras masterclasses da Super Week da Fundação Estudar:
Imagem destacada: Vicente Carvalho / Reprodução Projeto Draft