“Na filosofia up-or-out, ou você sobe, ou você sai da empresa”, resume o professor Marcelo Binder, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em uma conversa sobre o mercado de consultorias.
Este modelo de promoção, em que aqueles funcionários que não crescem na carreira acabam sendo demitidos, costuma ser bastante associado às carreiras em consultorias estratégicas, como McKinsey & Company, Boston Consulting Group (BCG), Bain & Company, AT Kearney, Kaiser Associates – para umas ainda mais do que para outras.
Ainda assim, também é encontrado em menor ou maior intensidade em outros tipos de consultoria, escritórios de direito, algumas universidades, e por aí vai.
Nesses ambientes de trabalho, existe uma carreira a ser trilhada com degraus bastante claros, e a expectativa é de que você cumpra essa caminhada em um tempo determinado. Normalmente, o ápice dessa escalada é um convite para se tornar sócio da empresa, espécie de recompensa por uma trajetória de dedicação intensa.
Nesse momento, a remuneração passa a ser variável, sendo influenciada pelo lucro da companhia, e costuma atingir valores bastante altos. Claramente, nem todos chegam ao topo – basta analisar a equipe de qualquer consultoria para perceber que os sócios são um círculo restrito.
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Tudo em seu tempo
Mas, antes, vamos entender o básico: como funciona esse sistema? Imagine que, em determinada consultoria, depois de dois ou três anos como analista, espera-se que você seja promovido para o cargo de associate. Passado esse tempo, aqueles que tiveram as melhores performances vão ser de fato promovidos, e os demais vão sair da empresa.
Em outras palavras, não existe a possibilidade de passar um longo período no mesmo cargo. Assim, não é como se o funcionário fosse demitido do dia para a noite. Como as rodadas de feedback são bastante frequentes, é possível perceber se sua performance está abaixo do esperado e prever o que está por vir.
Essa “saída forçada” muitas vezes significa uma porta de entrada para cargos seniores em outras indústrias, onde a expertise adquirida em consultoria é bastante valorizada. Os egressos das grandes consultorias formam uma bem-sucedida rede de alumni.
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Alta performance
Como em todas as carreiras, há vantagens e desvantagens em relação ao sistema up-or-out. Para alguns, perform-or-out seria o termo mais adequado, já que a ênfase está na performance dos funcionários. Se, por um lado, isso traz uma pressão maior para entregar resultados e ser produtivo acima da média, também é um mecanismo que proporciona uma perspectiva clara de crescimento dentro da empresa.
Não é raro que consultorias estratégicas apareçam no topo dos rankings que avaliam possibilidade de crescimento na carreira, já que a chance de permanecer estagnado em um mesmo cargo é nula. Todos os contratados podem, potencialmente, virar sócios.
Para o negócio, esse sistema traz um turnover alto de pessoal, o que costuma ser traduzido em equipes bastante jovens e com novos funcionários o tempo todo. Segundo André Chaves, principal no escritório paulista da Bain, cerca de 70% de sua equipe é formada por jovens da Geração Y, ou até mais novos.
Evidentemente, pessoas ambiciosas, que lidam bem com pressão e têm alto nível de energia, tendem se encaixar melhor e continuar no time. Profissionais de RH dessas empresas costumam defender que esse é o melhor jeito de manter uma equipe dinâmica e em constante desenvolvimento, oferecendo oportunidades de o time aprender e crescer o tempo todo.
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Flexibilidade
Mas será que esse modelo continua relevante, mesmo numa época em que a gestão de recursos humanos tende a lidar de maneira mais sofisticada com a diversidade de backgrounds e aspirações dos jovens? Parece que as próprias consultorias estratégicas têm se feito essa pergunta e vêm implementando certas ferramentas de flexibilização de carreira como forma de não perder talentos.
Algumas empresas possuem iniciativas como um part-time program, que permite que o funcionário desacelere o seu ritmo de promoção e tenha mais tempo livre – seja para viajar ou para passar mais tempo com a família.
“Você tem a possibilidade de ter um life style menos acelerado quando sua vida pessoal pedir isso”, conta a também consultora Daniela Carbinato, da Bain, que usa o exemplo da sócia da consultoria Luciana Batista, que passou um tempo em part time para lidar com assuntos pessoais. Segundo ela, questões como maternidade e casamento são levadas bastante a sério.
“As grandes consultorias estão começando a traduzir aqui para o Brasil essas práticas que começaram no exterior, de não ver com maus olhos você diluir sua ascensão como consultor”, ela explica. Para Daniela, cada país tem suas particularidades, e entender o mercado brasileiro e fazer daqui um bom lugar para se trabalhar é uma das condições para manter as melhores pessoas na empresa.
Se uma abordagem mais sutil ao sistema up-or-out tem surgido, refletindo melhor as aspirações da equipe durante e após seu tempo na consultoria, também é verdade que não há menos pressão para oferecer o melhor para os clientes. A realidade continua sendo que, na carreira de consultor, você é avaliado segundo a sua capacidade de entregar resultados.