Membros do time da consultoria Bain & Company, o sócio Rodrigo Maranhão e a gerente Wanessa Ferreira também são, paralelamente às suas funções na consultoria, fundadores da ONG Alcance, que identifica jovens de alto potencial no ensino público e dá apoio para que estudem em uma escola de alto nível e sejam melhor preparados para o futuro profissional. “Pagamos livros, comida, transporte, uniforme, a mensalidade e damos muito apoio, psicológico, mentoria, reforço”, conta Rodrigo.
O projeto da ONG veio a partir da frustração com os desafios do setor da educação, ao qual se dedicam, inclusive, no trabalho na consultoria estratégica global. Como eles, quem busca atuar com impacto social encontra um cenário promissor no ramo, de forma geral. “Em 2001, quando comecei, todas as consultorias tinham uma atuação muito tímida nesse aspecto, melhoramos muito nos últimos anos”, destaca o sócio.
Embora hoje trabalhar com impacto social em consultoria estratégica seja uma possibilidade, Rodrigo destaca que a carreira não é interessante para quem tem foco único em projetos desse teor, já que um consultor pode ser alocado para atuar em vários segmentos.
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A gerente Wanessa concorda que essa questão evoluiu no contexto atual: “quando entrei, estava focada em me desenvolver profissionalmente nas ferramentas de gestão e vi a parte de impacto social como algo que faria em paralelo, mas, ao longo da trajetória na Bain, vi que poderia juntar as duas coisas”, afirma.
Um dos primeiros projetos em que Wanessa atuou na companhia foi o responsável por fazê-la unir, logo cedo, seus dois objetivos – carreira em consultoria e impacto social. O trabalho em questão era para a Secretaria de Educação de Goiás, que havia levantado fundos junto à iniciativa privada para que a Bain os apoiasse em uma reforma educacional.
“Ao otimizar o uso de recursos na Secretaria, conseguimos redirecionar orçamento para ser investido em iniciativas que de fato impactam o aluno em sala de aula, mais diretamente.” Por conta do apoio na estruturação do trabalho, do time, e da implantação de medidas efetivas, o Estado pulou do 16º lugar no índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) do Ensino Médio para a primeira posição em menos de quatro anos, conta a gerente.
O que é preciso para trabalhar com impacto social em consultoria estratégica
Para um consultor estratégico, o ferramental exigido para atuar nos projetos de impacto social não difere dos outros projetos. Ou seja, resumidamente, saber quebrar problemas em questões menores, organizar e montar um plano de trabalho para atacá-los e chegar à solução do problema maior, explica Wanessa.
“O diferencial é que, ao final, ao invés de você estar ajudando uma empresa privada a ter um resultado financeiro melhor, você está ajudando uma ONG, e esse resultado financeiro depois é investido na própria organização, para ter mais impacto social”, diz ela.
Não existe um perfil profissional ideal, já que as habilidades necessárias variam muito de um trabalho a outro, destaca Rodrigo. Ainda assim, de acordo com o sócio, as soft skills acabam sendo competências bastante relevantes porque há muitos relacionamentos envolvidos nesse tipo de projeto. “Em organizações que, às vezes, não são tão bem estruturadas quanto outras em que trabalhamos, saber navegar, influenciar e fazer as coisas acontecerem tem um papel importante”, conclui.
Modalidades de projeto
Globalmente, a Bain se dedica principalmente a três frentes, quando se trata de impacto social: educação, desenvolvimento econômico e meio ambiente. Não há limitação sobre transitar entre os setores público, privado, terceiro setor, setor dois e meio, etc, até que o profissional se torne gerente, momento a partir do qual foca em uma área, de sua escolha.
Entre as possibilidades de atuar com impacto social, existem projetos regulares, como o case da Secretaria de Educação de Goiás, além de projetos pro bono (latim para “em benefício do público”) e low bono, em que os clientes não pagam nada pelo serviço ou pagam menos, respectivamente. A Bain se compromete a investir, em 10 anos,1 bilhão de dólares em projetos do tipo no mundo todo e, no Brasil, conta com pelo menos quatro parceiros anualmente.
Outra forma com que os consultores se envolvem com essas questões são por meio de iniciativas organizadas por um grupo interno – ações que são chamadas de office contributions. “Em consultoria é esperado que, além do projeto em que [o profissional] está trabalhando, também contribua para o desenvolvimento do escritório”, diz Wanessa. Dessa forma, os que se interessam por impacto social podem participar de atividades de voluntariado, realizar doações, ou assessorar organizações de forma pontual.
Como se dá a atuação no terceiro setor
Entre os critérios utilizados para avaliar as organizações que se tornarão parceiras, estão alinhamento de temática (em relação às frentes que a companhia apoia) e impacto real. Por fim, destaca Wanessa, a instituição precisa compreender o que a consultoria pode oferecer. Além disso, ter capacidade de avançar com o planejado depois que o projeto termina, por mais que exista um acompanhamento por parte dos consultores. “Não queremos que o relacionamento com a ONG seja de curto prazo, pelo contrário”, afirma.
A consultoria pode atuar de diversas formas, dependendo da necessidade da ONG. Exemplos de alguns cases reais em que os consultores da Bain trabalharam incluem planos de crescimento, estratégia de entrada no Brasil e estratégia de arrecadação de fundos.
“Amigos do Bem”
“Amigos do Bem” é uma ONG que apoia comunidades no sertão nordestino – em frentes como educação, infraestrutura, saúde, alimentação e trabalho -, com objetivo de melhorar a qualidade de vida dos sertanejos.
Uma das suas iniciativas tem como foco gerar trabalho por meio do que chamam de “produtos solidários”, que são produzidos no sertão e vendidos em outras regiões, como castanha de caju. Toda a renda gerada é reinvestida nos projetos sociais da instituição.
“Nosso projeto foi ajudá-los no desenho estratégico dessa linha de ‘produtos solidários’ para que a organização se tornasse mais autossustentável”, resume a gerente da Bain, “montamos um plano de cinco anos da área comercial, super ‘agressivo’”. Como resultado, a “Amigos do Bem” conseguiu um aumento relevante no volume de vendas, a partir de uma reestruturação em seu portfólio e canais, entre outras medidas.
Além de obterem aumento na receita e conseguirem gerar mais empregos, também desenvolveram uma estrutura organizacional mais “fluída” e um discurso mais eficiente em relação aos doadores.
“Fora o impacto na Bain”, acrescenta Wanessa. Membros do time da consultoria estratégica se tornaram voluntários e até se encontram regularmente com a diretoria da Amigos do Bem para acompanhar os avanços da ONG. Com esse projeto, recentemente, o escritório foi premiado, dentre todas as unidades das Américas, pela iniciativa de impacto social que mais gerou resultados.