Em 2014, a Organização das Nações Unidas criou a HeForShe, uma nova campanha em prol da igualdade de gêneros. O tema é um dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, que dão sequência aos Objetivos do Milênio.
A atriz Emma Watson, então recém-nomeada embaixadora da boa vontade da ONU Mulheres, foi a escolhida para apresentar a campanha, que busca angariar o apoio de homens em prol das mulheres. Seu delicado discurso em Nova York foi muito bem recebido – e visto mais de sete milhões de vezes no Youtube, na versão original –, e o debate ganhou espaço.
Uma das ramificações do HeForShe é o projeto IMPACT 10x10x10, em que 10 universidades, 10 chefes de estado e 10 CEOs de grandes empresas se comprometem em dar grandes passos rumo à igualdade de gêneros em seus respectivos campos até 2020.
Um relatório recente da McKinsey & Co., uma das empresas comprometidas, diz que a igualdade de gênero pode significar um estímulo de até US$ 28 trilhões na economia mundial até 2025.
No último Fórum Econômico Mundial, que aconteceu em janeiro, seis dos dez líderes empresariais viajaram a Davos para apresentar propostas e avanços em um painel moderado por Emma e colegas. Confira abaixo os destaques de cada um:
McKinsey & Co.
“A igualdade não é apenas um tema moral, mas econômico e de performance”, disse o CEO Dominic Barton. “Nossa missão é atrair, manter e desenvolver os melhores talentos e também ter um impacto duradouro em nossos clientes. E não estamos cumprindo essa primeira parte.”
Ele segue dizendo que 41% dos mais de 21,000 funcionários da consultoria são mulheres, mas elas estão menos representadas em cargos de liderança. “Não tem como dizer [que está certo] enquanto não forem 50%”, disse.
Barton chama de “solavanco” o plano que criaram para avançar. “Chegar dos 24% atuais aos 40% em cargos de liderança sênior, em cinco anos, vai exigir muito esforço.”
PricewaterhouseCoopers
“Equipes diversas são equipes mais fortes, que fazem decisões melhores, e isso está nos dados”, resumiu o CEO Dennis Nally. “Quando pessoas diferentes lidam com um desafio, a solução encontrada é muito mais criativa do que seria com apenas homens brancos.”
Na PwC, contou, a igualdade de gêneros já é uma realidade nos cargos de entrada, mas não na liderança. “No nível de sócios e acima, apenas 20% são mulheres”, diz. “É um desafio de negócios: não apenas atrair os talentos, mas mantê-los.”
Nally aposta na análise de dados para descobrir exatamente onde devem agir. “Estamos em 157 países pelo mundo, e queremos intervir no processo de administração das carreiras das pessoas”, falou. “Achamos que o problema tem a ver com dados e com fazer a pergunta na hora certa.”
O empresário concluiu dizendo que, em uma pesquisa interna recente com jovens funcionários, a PwC constatou que esta é uma geração focada em atingir um equilíbrio. Homens e mulheres não diferem em termos de flexibilidade, estilo de trabalho ou como querem conduzir suas vidas – não há diferenças de gênero nesse sentido.
“Então temos que atrair e manter este talento e garantir que o terreno seja o mesmo para ambos os gêneros”, resumiu. “Caso contrário, eles vão buscar essas oportunidades em outro lugar.”
Schneider Electric
Para Jean-Pascal Tricoire, CEO da gigante de energia europeia, “seria estúpido nos privarmos de 50% do talento do mundo”.
Em um campo onde pensar diferente é chave para o crescimento, ele diz que a inovação vem da criatividade, e ecoa Nally da PwC. “Uma comunidade mais inclusiva e equilibrada é fundamental para a inovação”, disse. “Uma sala só com homens… É triste.”
Dentre os líderes presentes, o desafio de Tricoire era substancial. Quando assumiu o posto, apenas 3% dos cargos de liderança da Schneider Electric eram ocupados por mulheres. Hoje, são 20%. “É insuficiente, mas um grande progresso.”
Unilever
A abordagem da Unilever, uma das maiores empresas do mundo, faz jus ao seu tamanho. Como o CEO Paul Polman explica, é a ideia de agir não apenas dentro da companhia, mas também nas áreas em que faz negócios.
“O maior impacto acontece na cadeia de valores”, disse. Lá, segundo ele, estão cinco milhões de mulheres que dependem da Unilever para seu sustento – e muita gente que pode ser pressionada para entrar nos eixos.
Por isso, a empresa se comprometeu com olhar todo e cada tema pelo prisma das mulheres. Os ângulos são três: direitos das mulheres (como direito à propriedade e à segurança), habilidades e oportunidades (como usar marcas e redes para criar empregos).
“É usar nossa escala e influência pelas mulheres”, resumiu. “Em qualquer coisa que avaliamos, elas são melhores investimentos.”
Tupperware
Do ponto de vista dos negócios, as mulheres são um recurso subaproveitado. Investir nelas, portanto, significa um enorme retorno sobre investimento. É o que diz o CEO Rick Goings antes de suscitar outra discussão.
“Muito dessa conversa sobre igualdade de gênero acontece no mundo desenvolvido”, disse. “Entendo a questão de quebrar o teto de vidro e é maravilhosa, mas a conversa precisa avançar para esses outros mercados, que têm 85% da população feminina.”
Ele acredita que a próxima era de trabalho, pós-automação, será uma marcada pelo trabalho autônomo, em que soft skills como motivação e resiliência serão importantes.
“Hoje, focamos nessa trabalhadora autônoma ao oferecer acesso à microfinanças, kits de venda gratuitos e treinamento”, explicou. “No México e na Indonésia, vimos essas mulheres saírem da classe baixa para classe média, aumentarem a autoestima, se sentirem como líderes e se conectarem com outras mulheres.”
O impacto não se restringe a elas, continua Goings. Companheiros e filhos também passam a tratá-las com mais respeito.
AccorHotels
Um de apenas dois CEOs comprometidos com instituir pagamento igualitário até 2020, Sebastien Bazin diz que a decisão é polêmica mas veio naturalmente. “Tentei achar uma única razão para não fazer isso, e ninguém deu uma boa.”
“Mas é preciso avaliar o gap, que é extremamente diferente entre as empresas e segmentos”, disse. A Accor Hotels está presente em 92 países e emprega cerca de 200,000 pessoas. Aqui, a chave e delegar para gerentes de hotel implementarem a política em cada uma das propriedades.
Outro plano para criar lideranças igualitárias é inusitado. O empresário criou um comitê “sombra”, formado por seis homens e seis mulheres. As equipes serão trocadas anualmente e terão acesso a todos os documentos confidenciais que o CEO tem e lidarão com os mesmos desafios e decisões, ao mesmo tempo que ele. Antes de decidir algo, Bazin vai consultar as decisões do comitê.
Por fim, Bazin também tocou no assunto maternidade.“Após ter um filho, você volta uma pessoa diferente, suas prioridades sofreram reajustes, você pensou sobre a organização e seu papel”, falou. “Você é ainda mais valiosa agora e eu quero que você volte.”
Twitter
Único representante do Vale do Silício, que lida com frequentes discussões sobre baixa representatividade feminina, o COO Adam Bain garantiu que a mudança começa já em 2016.
Os quadros da empresa verão mais diversidade em posições tecnológicas e de liderança e, para retirar qualquer preconceito inconsciente, as ofertas de salário são feitas sem que empregadores saibam os nomes do possível funcionário. “Queremos que as pessoas que formam a empresa reflitam a imensa diversidade dos usuários”, resumiu.
Além da revisão frequente de métricas, o Twitter também investe em conversar diretamente com seus funcionários para conseguir insights sobre como melhorar a empresa. “Um exemplo é que ouvimos de mulheres em posição de liderança que elas queriam mais mentorias, então começamos um programa”, contou.
Outro veio de uma dificuldade enfrentada por novas mães, que consideram um desafio amamentar seus filhos em viagens de negócios. “Então agora há um sistema de remessas global em que é possível mandar seu leite materno para sua família.”
Clube do livro feminista Emma Watson também criou recentemente um clube do livro virtual, “Our Shared Shelf”, dentro do site goodreads.com. A primeira obra escolhida por ela foi “My Life on the Road”, de Gloria Steinem. O grupo conta com quase cem mil inscritos.