A inteligência artificial pode soar como tecnologia de um futuro distante. Para nomes como o do brasileiro Lawrence Lin Murata, entretanto, é uma aposta a ser feita hoje. Formado na Universidade Stanford, o jovem criou a startup Newton Technologies, pensando em soluções para segurança nos transportes. “Usar a tecnologia para o bem social é o foco da minha carreira”, diz ele.
Essa trajetória começou cedo, quando passou a se interessar por problemas matemáticos e soluções tecnológicas. Lawrence estabelece um ponto de partida: as aulas de computação no Ensino Médio. A convite de um professor, juntou-se a um grupo de alunos para aprender o beabá sobre o tema. “Meu interesse pela computação teve raízes na matemática e, depois, foi incluindo problemas mais gerais”, explica ele.
A formação em Ciência da Computação, em Stanford, foi um caminho natural. Graças a uma campanha de crowdfunding, o brasileiro conseguira recursos suficientes para se manter na universidade. “Isso me mostrou o poder que a tecnologia tem de ampliar vozes, de aumentar a nossa rede”, pontua.
“Em todo lugar em Stanford, tem gente discutindo coisa nova”
A escolha de Stanford como destino também se encaixava nos planos de Lawrence. A princípio, o que atraía o jovem na universidade era a proximidade com o Vale do Silício e a cultura de empreendedorismo. Com tanta gente pensando soluções e ferramentas novas, não faltava encorajamento para lançar iniciativas por lá.
Como resultado, o brasileiro conta que mudou o próprio jeito de pensar. “Não houve um momento sequer em que eu não tivesse um projeto paralelo às aulas”, sintetiza ele. Um deles foi o CS + Social Good, encorajando iniciativas em ciência da computação que promovessem o bem social.
A abordagem prática nas aulas de Stanford também ajudou o então estudante. “Já na aula de introdução à Ciência da Computação, a maior parte da nota vem de projetos que têm relação com problemas reais”, detalha ele. Em sua primeira avaliação, elaborou uma versão simplificada de uma rede social, aos moldes do Facebook.
Logo passou a desenvolver ferramentas que iam além das aulas. Juntou-se a um amigo para lançar o OneTune, uma plataforma gratuita para streaming de músicas, ainda durante a graduação. Também criou uma assistente virtual, que chamou a atenção de engenheiros da Apple, mesmo antes da popularização da ferramentas como a Siri. “Eu tinha interesse na possibilidade de máquinas conversarem com seres humanos”, explica o brasileiro.
Lições do Vale do Silício
“Quando se tem alguma empresa como modelo, é importante observá-la de perto – e, se possível, de dentro”, resume Lawrence. Por isso, durante os estágios de verão, o brasileiro procurou trabalhar em empresas que o impressionavam. Começou na Apple, depois de chamar a atenção com seu projeto de assistente virtual.
A ideia era integrar sua iniciativa à empresa americana e colaborar com novas ideias. Logo de cara, recebeu uma orientação de seu chefe imediato: que deixasse sua imaginação fluir na hora de propor alternativas. “Trouxe essa ênfase em não limitar a imaginação para minha própria empresa”, diz o jovem de 23 anos.
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Durante o período na Apple, também aprendeu mais sobre como apresentar suas ideias ao público. “Antes da minha apresentação final, tive que mostrar meu trabalho para outras equipes, receber feedbacks e fazer adaptações para que ficasse perfeito”. Não raro, um mesmo arquivo de PowerPoint passava por vários designers e engenheiros antes de ser levado aos executivos.
Também como estagiário, seguiu para o setor de segurança da Microsoft. “Meu chefe era sempre rígido quando via qualquer problema, tinha muito rigor e atenção aos detalhes”, comenta ele. “Eu percebia que era um remédio com gosto ruim, mas que me ajudava muito”.
As vantagens de uma startup
Depois de aprender tanto com gigantes da tecnologia, Lawrence resolveu apostar no empreendedorismo e lançar a Newton Technologies. Ele enxerga vantagens no ritmo acelerado de uma startup e na flexibilidade desse estágio da empresa. “Em algumas semanas, chegamos a lançar uma ideia nova todo dia”, conta o brasileiro.
Por um lado, é possível escapar da burocracia e traçar mudanças rapidamente. Por outro, a volatilidade surge como efeito colateral. “É uma montanha-russa, em que, às vezes, você está no topo e, nas horas seguintes, lá embaixo”, compara. Nas palavras de Lawrence, apostar em uma ideia tão nova, em uma área como inteligência artificial, é se perguntar sempre “será que minha empresa vai acabar amanhã?”.
Outra dificuldade para quem traça um caminho inexplorado, em um setor de tecnologia, é a falta de referências. “Fazendo algo tão novo, a gente não consegue comparar com erros que já foram cometidos no passado e melhorar”, diz ele. Para evitar deslizes, as decisões precisam se pautar sempre em dados – e tudo pode ser questionado. “Por isso, meu trabalho como administrador é reduzir o viés cognitivo nas decisões e tratá-las como experimentos científicos”.
Inteligência artificial para o bem social na prática
À frente da Newton Technologies, Lawrence coloca em prática seu plano inicial na ciência da computação: apostar no bem social. O foco da empresa é propor soluções para reduzir o número de mortes no transporte. “Não faz sentido algum que, pra ir de A até B, alguma pessoa corra o risco de estar envolvida em um acidente ou em um crime”, resume o jovem.
Soluções criadas pelo empreendimento podem ser aplicadas em situações diversas. Por exemplo, uma ferramenta que sinalize em tempo real aos motoristas os riscos de comportamentos no trânsito. Nesse caso, acelerar ou frear bruscamente acionaria os sensores de alerta.
Para os pedestres, há também alternativas pautadas na inteligência artificial. Dessa vez, usando os sensores existentes nos smartphones, que captam informações sobre deslocamento, aceleração e movimentos do usuário. “Se você indica, pelo aplicativo, que está andando de um lugar a outro, mas muda a velocidade e a direção, de repente, isso é alarmante”, exemplifica Lawrence. Por outro lado, se várias pessoas correm em direções opostas, partindo de um mesmo ponto, também podem chamar a atenção do aplicativo.
A ideia já chamou a atenção de investidores-anjo, assim como os das empresas Dropbox e Doordash. Dessa forma, o empreendedor brasileiro espera impulsionar, com as soluções da Newton, o uso de dados para melhoria nos transportes.
Rodada de investimento
Assim como diversas startups, a empresa criada por Lawrence Lin Murata precisou passar por rodadas de investimento para conseguir um aporte de dinheiro. Em outras palavras, os meios para lançar seus produtos e ter como crescer no mercado, obtidos nas rodadas de investimento.
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“Normalmente, o processo começa com uma indicação”, explica o brasileiro. Ele reconhece a importância de sua universidade de origem, em especial, nessa etapa. “O fato de ter um e-mail como aluno de Stanford já me rendeu reuniões com investidores, por exemplo”.
Com a indicação garantida, é a vez de enviar uma descrição breve sobre o trabalho da startup. Caso aconteça um encontro presencial, os responsáveis pelo empreendimento devem apresentar um pitch. “É necessário convencer os investidores de que a empresa tem potencial para ser multimilionária no futuro, de que se trata de uma necessidade que existe e pela qual as pessoas estão dispostas a pagar”.
Para quem deseja criar uma startup e se prepara para uma rodada de investimento, Lawrence lista uma série de dicas práticas.
#1 Pense como os investidores
“A princípio, pense nas perguntas que eles se fazem quando cogitam um investimento, em quais pontos precisam ter confiança para tomar essa decisão”, detalha o brasileiro.
#2 Siga uma sequência lógica
Se a ideia é estruturar uma proposta, ela deve fazer sentido. “O investidor deve ver que o problema é A, a solução é B e que essa é a conclusão lógica”. Dessa forma, o empreendedor também “facilita” o trabalho de quem avalia o investimento.
#3 Crie uma demanda
Ou seja, a startup precisa parecer atrativa. “Mostre que tem muita gente boa na sua empresa e que está conversando com vários investidores interessados”, sintetiza Lawrence.
#4 Priorize sua equipe e sua empresa
“Mais importante do que a imagem é a realidade”, diz o paulista. “Se você souber vender a ideia muito bem e levantar um aporte, vai ter que demonstrar seus progressos na próxima vez”.
Por isso, resta ao empreendedor construir uma iniciativa sólida, em que a equipe funcione de fato – o que atrai mais gente interessada em trabalhar na área. “Quanto mais talento a gente atrai e retém, mais atrairá no futuro”.
Esta matéria foi originalmente publicada no portal Estudar Fora.