“Queria muito escrever um livro, mas me perguntava: quem vai se interessar? Será que não é pessoal demais? E se for um fracasso?”
Mesmo depois de várias conquistas profissionais, essas dúvidas rondavam a cabeça da escritora e empreendedora Daniela Arrais, sócia-fundadora da @contente.vc. Foi no meio de todas essas inseguranças que ela decidiu mergulhar no estudo do fenômeno conhecido como síndrome da impostora.
“A sensação era de que nunca estava pronta, de que faltava um curso, um detalhe, uma validação externa para que eu pudesse, finalmente, me autorizar a fazer o que quer que fosse”, lembra.
Ela é autora do livro Para todas as mulheres que não têm coragem, em que compartilha sua experiência com a síndrome e como ela aprendeu a enfrentá-la. A trajetória de Daniela ecoa a de muitas outras mulheres que, apesar de conquistas concretas, seguem sendo sabotadas por uma sensação de insuficiência.
Como a síndrome da impostora se manifesta
De acordo com uma pesquisa feita pela KPMG e citada pela Forbes 75% das executivas já viveram a síndrome da impostora em algum momento da carreira. Segundo o estudo, a sensação tende a se intensificar em momentos de promoção ou de transição para novos cargos.
O fenômeno é marcado pela sensação de não merecer o sucesso, de precisar se provar todos os dias, ou de nunca estar pronta o suficiente. Ele aparece em pensamentos recorrentes de autossabotagem, como o medo de não corresponder às expectativas, a dúvida sobre a própria competência ou a crença de que conquistas se devem apenas à sorte.
Para muitas mulheres, isso significa viver sob a constante pressão de entregar mais do que o esperado, sem nunca se sentir realmente legítima no espaço que ocupa.
Essa dinâmica não só prejudica a confiança individual, mas também consome energia emocional e pode frear o avanço na carreira.
Daniela lembra que só começou a romper essa lógica quando percebeu que não estava sozinha: “O que mudou foi perceber que isso não era um problema só meu. Quando compreendi que esse mecanismo estava em jogo, entendi também que precisava falar sobre ele. Porque nomear as coisas nos liberta e nos dá mais ferramentas para enfrentá-las”.
Ao entrevistar outras mulheres para seu livro, ela encontrou força na troca de experiências: “Passei a olhar para mim e para minhas conquistas com mais generosidade, e a entender que muitas vezes somos maiores do que imaginamos”.
Um problema estrutural
A síndrome da impostora não é fruto de uma mente frágil, mas de um sistema desigual. Como explica Daniela, ela é consequência de uma sociedade historicamente organizada por homens e para homens:
“Desde pequenas, aprendemos que meninos são valentes e ousados, enquanto meninas devem ser delicadas, comportadas, bonitas. Há estudos mostrando que meninas a partir de cinco ou seis anos já internalizam a ideia de que pertencem a um grupo inferior. Isso é brutal”, afirma.
Um artigo da Human Resources Professionals Association alerta que, mesmo quando mulheres criam conexões, se mostram resilientes e trabalham mais, ainda enfrentam discriminação, abusos de poder e disparidades salariais que impedem seu avanço. O cenário é ainda mais grave para mulheres negras, trans, lésbicas, bissexuais, imigrantes e de outras minorias.
“Quando acreditamos que a impostora é só uma fraqueza nossa, reforçamos a culpa e o isolamento. Mas quando entendemos que é estrutural, podemos começar a nos fortalecer, individual e coletivamente. É uma mudança de chave: não é você que não consegue dar conta, é o mundo que ainda insiste em te diminuir, em não te dar espaço”, diz Daniela.
Como calar a síndrome da impostora
Se a síndrome tem raízes estruturais, também precisa ser enfrentada de forma coletiva. As empresas têm responsabilidade em rever suas práticas e culturas internas, mas, ao mesmo tempo, mulheres podem se apoiar em estratégias para calar a impostora no dia a dia. Daniela sugere algumas:
Crie redes de troca
“É importante conversarmos com outras mulheres, compartilhar nossas dúvidas e inseguranças, porque a impostora se alimenta do silêncio. Quando a gente fala, quando escuta, percebemos que não estamos sozinhas. Isso já é meio caminho andado”, conta Daniela.
Ressignifique o medo
“Eu mesma aprendi que ele não vai desaparecer. O que dá pra fazer é atravessá-lo. É uma aposta: a gente se joga e descobre que é mais capaz do que a gente imaginava”, recomenda.
Pare de esperar estar 100% pronta
“Enquanto os homens se candidatam a vagas atendendo apenas parte dos requisitos, as mulheres acreditam que precisam cumprir tudo à risca. É uma armadilha que nos paralisa. E a verdade é que já temos plena capacidade de ocupar qualquer espaço agora”, alerta.
Autorize-se a ser do tamanho dos seus sonhos
“A gente exercita a coragem, doma as vozes da impostora, vai se fortalecendo. Vamos sentir medo e insegurança, mas eles não serão mais capazes de ditar os rumos da nossa vida”, defende Daniela.