O conceito de voluntourism, neologismo para turismo voluntário, ainda é novo no Brasil. Tão novo, na verdade, que a Volunteer Vacations é a única agência especializada em férias voluntárias por aqui. Comandada por Mariana Serra desde 2014, realiza cerca de 250 viagens ao ano e tem 12 mil interessados cadastrados no sistema – um sucesso construído com calma e perseverança.
“Isso é uma coisa que todo empreendedor deve saber: o caminho é duro, parece que fazem de tudo para te desestimular”, conta ela. “Mas o empreendedor nato gosta de desafio, entende que vai errar, aprende a crescer com o erro e sabe que vai ter que aprender para evoluir.”
Hoje com 30 anos, Mariana é formada em Relações Internacionais pela ESPM e voluntária desde jovem. É também uma viajante de longa data e morou três anos fora, no Taiti e na Nova Zelândia.
De volta ao Brasil e ainda na faculdade, começou seus quatro anos de trabalho como assistente do embaixador Luiz Felipe Lampreia, Ministro das Relações Exteriores no governo FHC. Depois, seguiu um caminho corporativo que terminou na área de Relações Institucionais da Andrade Gutierrez, gigante de seu segmento.
Durante este período, quando fazia um curso de criação de negócios inovadores no IBMEC e já pensava em empreender, Mariana participou da Jornada Warren Buffet e descobriu o conceito pelo qual se apaixonou. Com um pequeno grupo de colegas, ela viajou aos EUA para um jantar e uma sessão de perguntas e respostas com o investidor americano.
“Foi ali, com o mais famoso filantropo do mundo e alunos de diferentes faculdades americanas, que descobri conversando que poderia viajar para ajudar outros durante minhas férias”, lembra, destacando que voluntourism já é uma noção bem estabelecida em outros países.
Início Voltou ainda entretendo uma ideia de criar um portal sobre viagens, no qual poderia falar sobre coisas como trabalho voluntário. Quando André Fran, apresentador de dois programas de televisão sobre o assunto e hoje seu sócio, lhe apresentou um conceito similar – o volunteer vacations do título, que significa “férias voluntárias” –, tudo se encaixou.
“Viajar e ajudar era meu sonho e aquilo ficou na minha cabeça”, diz. “Então pensei: por que não levar para fora pessoas que queiram, como eu, viajar com algum propósito?”
Abandonou a ideia do portal e, com André e Alice Ratton, começou a planejar o negócio. “Fizemos o beabá: business plan, modelo canvas, análise SWOT…”, lembra. Fizeram também uma pesquisa, para ter noção da demanda do mercado. “Afinal, estaríamos literalmente movimentando um novo segmento e nossas referências eram todas de fora.”
Enfrentando a burocracia e o ceticismo inicial, o trio investiu dinheiro do próprio bolso e escolheu um modelo de negócio social, que tem como finalidade o impacto social e reinveste os lucros para aumentá-lo.
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Surpreenderam-se com a recepção positiva do mercado, mas ainda enfrentam obstáculos, especialmente na hora de explicar o que é ser uma empresa social com fins lucrativos e conseguir novos investimentos. “O empreendedorismo social ainda é muito jovem, especialmente aqui, então conceituar e introduzir isso na cultura brasileira é um dos maiores desafios”, explica Mariana.
Como funciona Atualmente, a Volunteer Vacations planeja viagens para 13 países – Afeganistão, Tanzânia e França são alguns dos destinos – e tem mais de 20 instituições parceiras em cada um. As ONGs são escolhidas com base em critérios como impacto real, feedback de pessoas atendidas e transparência fiscal e financeira.
E para interessados, a experiência começa bem antes do embarque. É preciso primeiro preencher uma ficha com seu histórico, perfil e intenções. Em seguida, a equipe repassa as informações para as instituições parceiras, que respondem se têm vagas no período em questão e se precisam daquela ajuda.
Com um OK em mãos e as taxas pagas, dá-se início a um processo extenso de preparação, que envolve curso de voluntariado, engajamento online e estudo da cultura local. Uma vez no exterior, com vistos e vacinas resolvidos, o voluntário é recebido no aeroporto. Durante a viagem, ele conta com suporte local e apoio online 24h, caso seja necessário. Na volta, ganha um certificado de voluntariado e capacitação.
A metodologia de preparação veio da necessidade que a própria Mariana sentiu em suas primeiras experiências no exterior, que incluiram países como Quênia, Índia e Tailândia.
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“Não é simplesmente comprar a passagem e ir”, resume ela, que visita pessoalmente cada um dos destinos e organizações parceiras antes de inclui-los no portfólio. “Nos preocupamos com todas as expectativas do voluntário e da ONG. Se ele não chegar preparado, nós levamos um problema e não uma solução.”
Motivação Para aumentar ainda mais a familiaridade dos brasileiros com a ideia de unir viagem e voluntariado, Mariana vive em aeroportos, voando de uma palestra para outra. É quando consegue um tempo para assistir TED Talks, um de seus vícios como empreendedora. (Dan Palotta, Bill e Melinda Gates e Peter Singer são seus favoritos.)
Ela também se ocupa com a criação de um curso de formação para empreendedores sociais coordenado por Thiago Almeida, professor do IBMEC e da ESPM, e com o desenvolvimento da Rede de Empreendedores Sociais Brasileiros. Será a primeira do tipo no país, com intuito de potencializar negócios sociais Brasil afora e influenciar políticas públicas.
Sua grande motivação, no entanto, ainda é o cerne de seu empreendimento: a paixão pelo voluntariado. “É algo que faz bem para si mesmo e ajuda o próximo”, diz. “Você sai da sua zona de conforto, trabalha em equipe, cresce, aprende. A experiência te transforma como ser humano.”