No começo deste ano, dois fatos interessantes chegaram à minha atenção. O primeiro, é que a Starbucks anunciou que está alterando a composição do seu Conselho para que ele reflita melhor a diversidade de gêneros e etnias que são encontrados na empresa.
Segundo, é que no Vale do Silício, impressionantes 45% da mão de obra total nas empresas de STEM (ciência, tecnologia, engenharia e matemática) é de pessoas que nasceram fora dos Estados Unidos . E dizem que, entre os programadores, este número chega a ainda mais impressionantes 70%.
Se o primeiro pode ser confundido com uma iniciativa midiática politicamente correta (embora eu acredite que seja consistentemente alinhada com os valores que a empresa tem expressado em suas ações), o segundo é indiscutível — é estatística.
O Vale do Silício precisa e se beneficia deste pool de talentos que vem do mundo inteiro. Isto traz uma série de benefícios táticos e operacionais, mas o mais importante deles é simples de ver – amplitude de mercado: 36% do faturamento total das empresas vem de fora dos EUA!
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Colocando essas informações em perspectiva, você entende quão irresponsável o Trump está sendo?
O mesmo padrão observado no Vale do Silício se repete em outros ecossistemas inovadores pelo mundo: Nova York tem 34% de estrangeiros em suas STEMs, Boston tem 33%, Londres tem impressionantes 53% (e tem gente que acha que o Brexit faz sentido…), Berlim tem 49%, Singapura tem 52%. Infelizmente, São Paulo (a melhor da América Latina) tem apenas 7%.
Mas, por que isto acontece? É uma espécie de corrida do ouro do século 21? Também é. Mas é bem mais profundo que isso…
Em seu livro O Futuro da Administração, Gary Hamel afirma que estamos em um momento de mudança do paradigma cultural e dos princípios por trás dos modelos de gestão de nossas empresas. Estes princípios estão tão arraigados que tendemos a não desafiá-los em condições normais.
São eles: padronização, especialização, alinhamento de objetivos, hierarquia, planejamento e controle, recompensas extrínsecas.
Esta foi a escola do Século XX, a base da administração como a conhecemos. Lembre-se que a primeira escola de administração foi fundada em 1881 em Wharton, o primeiro MBA foi em 1908 em Harvard, o primeiro curso de administração oferecido fora dos EUA foi apenas em 1951 na África do Sul. E que no Brasil começamos apenas em 1952. Se você é jovem, pode parecer muito tempo, mas, acredite, é pouco tempo no campo das ideias.
Estes princípios foram perfeitos para criar a grande sociedade industrial e nos levar até a globalização. Mas não foram muito mais longe que isso!
Foi aí, na virada do século 21, que o modelo começou a demonstrar falhas estruturais. Esse sistema baseado em padronização, controle e hierarquia, entre outros defeitos, não consegue explicar adequadamente a potência e os princípios de sucesso por trás dos ecossistemas empreendedores, como o Vale do Silício e dezenas de outros que estão se desenvolvendo por todo o planeta.
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Nós ainda não resolvemos este problema, mas autores como Eric Ries estão propondo formas novas de pensar e que merecem nossa atenção. Se você não conhece, eu sugeriria que você comprasse hoje seu livro “A Startup Enxuta”.
Outros que merecem sua atenção são o “Business Model Generation” e o “Value Proposition Design” do Alex Osterwalder e o “Startup Owner’s Manual” do Steve Blank (um bom resumo deste livro virou um curso online que a Endeavor disponibiliza de graça em seu portal). Vale a pena também jogar “Holacracy” e “Holonomics” no Google para se aprofundar!
Hamel propõe que os princípios fundamentais deste século sejam: adaptabilidade, inovação e atratividade.
Deixa eu me restringir à adaptabilidade. Porque é daqui que a gente chega à diversidade como gerador de valor estratégico.
Adaptabilidade, como a vida nos ensina, requer variedade e seleção. Quem conceituou isto primeiro foi Darwin em 1859. Depois outros cientistas refinaram o conceito. Para nós o que importa é o que isto nos ensina sobre o que torna uma empresa mais eficaz em se adaptar às demandas do ambiente (e prosperar), ou menos eficaz (e morrer).
As menos eficazes são fáceis de reconhecer. Estas empresas estão ancoradas em profundidade excessiva no paradigma antigo e, quando percebem que têm que mudar, já é tarde demais para fazer o movimento. Isto acontece por vários motivos, mas um dos mais relevantes, como nos ensinam as ciências da vida, é o fato de que elas possuem uma população pequena e endogâmica tomando ou influenciando a tomada de decisões.
Ou seja, quanto menor a Diversidade, mais difícil é a adaptação pelo simples fato de que todos pensam igual e não há estímulo prévio (antes da tempestade) para experimentar o novo.
Isto é chamado de armadilha do consenso. E quanto mais homogênea for a população, maior o risco de cair nela de forma inconsciente.
As mais eficazes são as empresas que se adaptam mais rápido. São as que, na verdade, se pré-adaptam. Isto é, são empresas que conseguem dar saltos rápidos em capacidade funcional porque já estavam experimentando (antes da tempestade) o novo.
Ser muito adaptável é bem mais difícil do que parece. Como falamos, é uma questão de princípios por trás das práticas de gestão. Alguns deles têm que estar interiorizados.
Você tem que aceitar que: A experiência supera o planejamento. Os sistemas de gestão têm que incentivar a pré-adaptação estratégica. Eficiência e eficácia não podem ser as únicas métricas. Todas as mutações são enganos. Até que dão certo. A busca pela perfeição é inimiga do progresso. Ela tira o apetite pelo risco, a tolerância com o erro. E que, quanto maior o pool genético, melhor.
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Neste último item é que está o grande valor da Diversidade. Quanto maior a diversidade, maior a capacidade de adaptação. Quanto maior a diversidade – de pensamento, habilidades, atitudes e recursos – maior a variedade de respostas adaptativas.
Quanto mais diversidade, mais chance da sua empresa sobreviver e ter mais sucesso que seus concorrentes em situações novas. E prosperar. E crescer.
Quanto maior o repertório de experiências de vida que temos em conjunto, maior nossa capacidade de apresentar a resposta mais eficaz em um momento de instabilidade e mudança. E instabilidade e mudança regem nosso dia a dia no século 21.
Em resumo, diversidade não é um luxo, é um diferencial competitivo. Ela nos torna mais adaptáveis. Diversidade é útil no curto prazo por nos prover um banco de talentos mais rico para alocar e executar em alto desempenho o que nos comprometemos a fazer. Diversidade é útil no tempo da estratégia para prover maior capacidade de nos pré-adaptar à realidade futura.
Tem um misto de empreendedor, futurista e cientista nascido na Bélgica chamado Walter De Brower, que disse que “Toda inovação começa com um ato de insubordinação. Ela começa dizendo ‘não’ com desrespeito. Se você respeita e ouve tudo que dizem, não há inovação”.
Gosto muito desta frase. E é a partir dela que quero te fazer uma provocação: Olhe com calma para a formação do seu time. Quem é aquele corajoso que, em um ato de insubordinação, vai desrespeitosamente questionar o modo como as coisas são feitas e propor algo inovador? Quem realmente pensa diferente porque é diferente?
Você tem gente suficiente assim? E aí, o que você vai fazer a respeito disto?
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Daniel Castello, autor do texto, é consultor e palestrante nas áreas de estratégia e gestão de pessoas.
Este artigo foi originalmente publicado em Endeavor