O Social Good é um movimento internacional global baseado no conceito de usar a tecnologia e o pensamento inovador para resolver problemas sociais. Uma vez por ano, o Social Good Summit reúne, na Assembléia Geral das Nações Unidas, em Nova York, convidados para mostrar em dois dias os principais impactos de iniciativas desenvolvidas no mundo inteiro.
“O conceito do Social Good está muito atrelado à ideia de empoderamento das pessoas por meio das tecnologias democratizantes”, diz Carolina de Andrade, de 36 anos, diretora do Social Good Brasil, o SGB. Por aqui, é ela quem materializou isso, em um negócio social focado em inspirar e ajudar a desenvolver iniciativas nesse sentido.
O SGB tem um calendário extenso de eventos, seminários e festivais para expor iniciativas de sucesso e, também, tem um LAB, aberto a qualquer empreendedor que tenha uma ideia de negócio social e precise de orientação.
Mas vamos à Carol para entender como tudo isso se organizou. Formada em relações internacionais em Florianópolis, onde nasceu, ela tem uma história conectada desde cedo a negócios sociais: “Todo mundo que quer fazer algo de impacto social começa com um pouco de ingenuidade, mas isso é importante”.
Para ir além da boa intenção, ela se especializou em empreendedorismo e foi para a Holanda fazer um estágio graças à AIESEC, organização mundial de liderança jovem. Quando voltou, trabalhou durante quatro anos na Artemísia, organização de fomento de negócios de impacto social em São Paulo. Ao longo do ano de 2010, dedicou-se a um mestrado de gestão de tecnologia e inovação na University of Sessex, na Inglaterra.
Quando voltou para a capital catarinense, Carol conheceu as fundadoras do Instituto Comunitário da Grande Florianópolis e do Instituto Voluntários em Ação.”Elas tinham ido para o Social Good Summit em Nova York e me chamaram conversar. Lá surgiu a ideia de montarmos um programa”, conta.
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No início de 2012, juntas elas fizeram um evento e um programa de apoio aos empreendedores em Florianópolis que foi a semente do SGB. Um dado importante é que, já neste começo, a iniciativa contava com os primeiros apoiadores, que seguem até hoje no SGB: Fundação Telefónica e o Instituto C&A.
A fundadora conta que a ideia do SGB é impulsionar o protagonismo das pessoas, oferecendo ambientes de conexão e troca, suporte e apoio. “Entendemos a tecnologia como uma ferramenta poderosa de transformação social, ultrapassando ONGs, e incluindo coletivos e movimentos”, diz, e prossegue: “As pessoas estão no centro. Tecnologia e inovação são ferramentas”.
Social Good Brasil: inspirar e ajudar a inovação social
O SGB funciona com estrutura de associação. São 13 pessoas: seis associados, quatro associados-diretores e três associados conselheiros-fiscais. Além deles, há seis funcionários contratados e cinco consultores. Para atingir a sua missão, esse time trabalha em duas frentes: de um lado, inspirar e despertar pessoas para o seu papel de mudança social; de outro, e dar apoio para quem já sabe e esta decidido a ser empreendedor.
Na primeira frente está o festival do SGB, que acontece uma vez por ano em Florianópolis, dura dois dias e reúne presencialmente cerca de 1 000 pessoas, além de ficar ao vivo na web. Na última edição, mais de 60 mil pessoas acompanharam o streaming e os vídeos disponíveis.
“A ideia do festival é ajudar algumas pessoas a estourar a bolha, principalmente para quem não tem contato com inovação social”, diz Carol. Os convidados são pessoas ligadas a tendências de inovação social e o festival tem oficinas, rodas de conversa e painéis com nomes que são referências mundiais.
Esse ano passaram por lá Dylan Hendricks, diretor do programa Ten Year Forecast, do Institute for the Future, Darlene Damm, diretora do prêmio Desafios Globais na Singularity University, além de assuntos como tecnologias avançadas e democratização delas, blockchain, inteligência artificial e a importância de habilidades mais humanas como a empatia.
Na mesma frente de atuação ainda estão a plataforma do SGB e documentários como o Conectados Transformamos, que apresenta uma série de negócios sociais e seus fundadores. Um segundo documentário, o Em Frente, conta a história de nomes importantes do universo dos negócios sociais no Brasil e deverá ser lançado em fevereiro de 2017 nos cinemas.
A outra grande frente do SGB é o apoio a quem já decidiu que quer gerar impacto social. Desde o começo existe o LAB, que é um laboratório para desenho de modelos de negócio de impacto social, estudo de tecnologias, prototipação e testes. “A jornada dura quatro meses e conta com uma parte presencial que acontece em Florianópolis, além de um parte digital e das mentorias”, diz Carol.
O LAB agrega 50 projetos por ano e os 4 finalistas fazem um pitch durante o festival: a votação do público define quem irá receber um investimento semente. O capital vem dos próprios empreendedores, que pagam uma taxa de participação de 800 reais que compõe um fundo. Este ano, o fundo tinha 47 mil reais.
Carol fala de alguns dos negócios sociais que passaram pelo LAB. “Gosto da história da Alcione, uma das empreendedoras deste ano. Ela sempre se preocupou com o desperdício de alimentos e enxergou que não havia problema de escassez, mas sim de distribuição. A solução que ela criou foi desenvolver um aplicativo para automatizar e dar visibilidade para a distribuição de alimentos de organizações sociais que já faziam esse trabalho.”
Outra iniciativa que passou pelo LAB é a Communitor Smart Communities, software para monitoramento do aedes aegypti: “Eles estavam em outra fase do negócio. Desenvolveram a tecnologia para identificar com mais velocidade áreas foco do mosquito, se conectaram com prefeituras e já tem resultados”.
Ao todo, cinco turmas do LAB criaram 173 projetos e 330 empreendedores foram apoiados de todo o Brasil.
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Além do Festival e do LAB, o SGB estreou no ano passado o Camp, uma pré-aceleração para empreendedores sociais que usa uma metodologia de uma incubadora americana, GSPA, do Vale do Silício.
Na prática, é um acampamento de três dias intensivos para ajudar dez empreendedores que já têm resultados a criarem um plano de crescimento. “Percebemos que o Camp é ótimo para apoiar negócios que têm modelos descentralizados de gestão, em rede e mais coletivos”, conta Carol.
O Camp só acontece se houver investidores interessados, geralmente empresas e institutos. Também funciona como o LAB, com uma taxa de participação de 500 reais que depois é distribuída para três finalistas como capital semente.
A dificuldade de equilibrar as contas
Carol fala com satisfação e segurança sobre os projetos realizados. Ela sabe, no entanto, que os maiores desafios da SGB estão relacionados ao modelo de negócios, já que eles optaram por ser uma associação sem fins lucrativos, a Associação Social Good Brasil: “Hoje, estamos tentando encontrar um modelo de negócio mais híbrido”.
Nesse sentido, Carol conta que um desafio é entender e comunicar a proposta de valor do SGB para os apoiadores. Outro gargalo é ter uma clareza maior sobre as possibilidades de prestação de serviços do SGB e montar uma frente mais forte de busca comercial. Nessa linha, ela aponta alguns avanços recentes: “Temos um LAB temático, customizado, com a Natura e um de moda com o Instituto C&A”.
Sobre o assunto, a diretora também fala sobre o impacto da recessão econômica de 2016 para a captação de recursos de doação de pessoas jurídicas. Empresas e institutos ficaram mais conservadores e diminuíram as doações. Não restou alternativa: “Tivemos que reduzir equipe de comunicação e fazer mais projetos com a mesma quantidade de pessoas. Acabamos o ano com a equipe exausta”, diz Carol. Apesar das dificuldades, o SGB teve um faturamento de R$ 1,2 milhão este ano. E recebeu mais de 100 mil reais de doações de pessoas físicas.
A diretora segue listando as dificuldades do negócio: um dos desafios ainda não superados é aumentar a diversidade nos programas. “Ainda estamos bem longe do que queremos em proporcionalidade de renda, de raça e de pessoas com deficiências. Nossa estratégia para avançar neste sentido é a rede de Fellows”, diz, e vislumbra o que quer ver em inovação social no país: “O protagonismo pode ser de qualquer pessoa, pode acontecer em qualquer lugar. Precisamos de menos histórias de heróis”.
O programa de Fellows, que começou nesse ano, está conectado a um movimento de expansão e descentralização do SGB. Foram selecionadas 14 lideranças sociais de todo o Brasil, entre mais de 100 inscritos. Em 2017, esses parceiros vão trabalhar com o SGB e terão acesso às metodologias utilizadas para aplicação em suas comunidades. Será, quem sabe, uma transformação do Social Good Brasil de dentro para fora. Para mudar o jogo de fora para dentro.
Artigo originalmente publicado pelo DRAFT.
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