Ana Moraes
Publicado em 25 de setembro de 2025 às 12:08h.
Perceber que está na hora de mudar de carreira não é simples. Esse processo envolve medos, inseguranças e, muitas vezes, uma sensação de solidão. Afinal, a sociedade costuma valorizar trajetórias lineares e estáveis, o que faz com que muitos profissionais tenham dificuldade em admitir sua insatisfação no trabalho, ou com suas escolhas.
No entanto, o desejo de mudança é cada vez mais comum. Pesquisas recentes mostram que uma grande parcela da força de trabalho considera a transição de carreira em algum momento da vida, seja por falta de propósito, cansaço ou busca por novos desafios. A boa notícia é que existem formas seguras e planejadas de encarar esse recomeço.
Neste artigo, vamos explorar os sinais para mudar de carreira, os principais medos que surgem nesse processo, dicas práticas para se organizar e histórias que provam que a reinvenção profissional é possível — e recompensadora.
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Identificar os sinais de que chegou o momento de mudar de profissão é o primeiro passo. Muitas vezes, eles aparecem de forma sutil, mas se tornam cada vez mais fortes com o tempo.
Se você começa a semana já contando os dias para o próximo fim de semana, ou sente falta de energia para executar tarefas simples, esse é um dos sinais mais fortes de insatisfação no trabalho. A motivação pode oscilar naturalmente, mas o desânimo persistente é um alerta importante.
Quando não há novas oportunidades de aprendizado ou crescimento, a sensação de estar preso em um ciclo sem evolução aparece. Isso indica que sua carreira atual pode ter chegado ao limite do que pode oferecer.
Se sua função ou a cultura da empresa entram em conflito com seus valores, a longo prazo isso gera desgaste e frustração. A busca por propósito profissional é cada vez mais determinante para a satisfação no trabalho.
Burnout, ansiedade e estresse crônico podem ser reflexos diretos de um trabalho que não faz mais sentido para você. Sua saúde é prioridade — e muitas vezes, a mudança de carreira é parte da solução.
Muitos profissionais percebem que querem impactar positivamente o mundo ou sentir que seu trabalho vai além do salário. Esse desejo pode ser o gatilho para explorar novas áreas de atuação.
Sentimento de que você não está usando seu verdadeiro potencial no dia a dia.
Permanência no emprego apenas pelo salário, sem qualquer prazer na função.
Uma inveja saudável de pessoas que seguiram novos caminhos.
Parte da equipe do Na Prática já atravessou uma transição de carreira. Cadu Capella e Carina Bacelar contam como (e por que) migraram de área.
Carina Bacelar, Coordenadora de Conteúdo e Editora do Portal Na Prática:
“Definitivamente não foi uma trajetória linear. Eu sou jornalista de formação, e trabalhava como repórter cobrindo hard news, mas tinha uma intuição de que era jovem demais, e precisava explorar outros campos da comunicação.
Quando tinha 15 anos, por exemplo, cogitei cursar Cinema na universidade, mas nunca levei a ideia adiante. Aos 26 anos, decidi deixar o jornal onde trabalhava. Comecei um mestrado em comunicação estratégica em Lisboa, já querendo experimentar a área de marketing.
Passei anos economizando e me preparando antes de fazer esse movimento, sou muito pragmática. A entrada na área de marketing de conteúdo foi lenta e progressiva, com as primeiras oportunidades como redatora de textos focados em SEO, quando ainda estava em Portugal.
As experiências que viram depois foram se construindo em cima das anteriores. Inclusive a minha vivência como copywriter no mercado de tecnologia. De todo modo, acho que nunca deixei de usar minhas habilidades como jornalista a meu favor nessa jornada”.
Cadu Capella Reis, Especialista em Produtos Educacionais do Na Prática:
“No momento em que eu fiz 30 anos, coloquei no papel uma reflexão muito importante, que é: como eu quero ser daqui a 10 anos. Quem é o Cadu com 40 anos de idade?
Eu realmente peguei um papel e uma caneta e comecei a ilustrar quem eu achava que seria o Cadu de 10 anos para frente. Naquela altura, eu já estava empreendendo há mais de 10 anos, eu tinha montado uma agência de comunicação e marketing com sócios, e fui evoluindo na minha carreira.
Eu era formado em Publicidade e Propaganda, passei por várias evoluções acadêmicas também. Mas naquele momento eu estava fazendo muito trabalho voluntário em Educação. Que era um chamado muito importante, e me completava muito.
Quando eu comecei a desenhar o Cadu de 40 anos, eu percebi que não era mais o publicitário empreendedor que estava saindo, e sim uma liderança em Educação, voltada para impacto.
Ao botar no papel, assumi para mim mesmo que deveria fazer uma transição de carreira e deveria me preparar para aquele processo, criar coragem para falar com meus sócios na época e virar a rota”.
Reconhecer que é hora de mudar não significa que a decisão será fácil. O medo de mudar de carreira é natural e precisa ser compreendido.
A estabilidade é um fator importante, e sair dela requer planejamento. O medo de perder sua fonte de renda ou não se adaptar a um novo setor é uma das maiores barreiras.
Comentários como “você vai jogar tudo fora?” ou “é muito arriscado” podem pesar na decisão. É importante lembrar que quem vive sua rotina é você, não os outros.
Perguntas como “será que vou conseguir um emprego na nova área?” ou “não é tarde demais para recomeçar?” são comuns. Trabalhar essas inseguranças com planejamento para mudança de carreira ajuda a reduzir a ansiedade.
A transição se torna mais segura quando bem estruturada. A consultoria global McKinsey costuma sugerir em um guia quatro passos para os próprios colaboradores que querem mudar de carreira:
Tanto do ponto de vista pessoal (por exemplo, quais são meus pontos fortes, valores e fatores de sucesso pessoal?) quanto externos (por exemplo, o que realmente ‘existe’ para mim no mercado?). É uma etapa inicial de autoconhecimento.
Ter clareza sobre o valor único que você pode trazer para uma organização, escrevendo um currículo convincente e se comunicando com clareza durante suas conversas de networking e entrevistas.
Isso importa não só na forma como você se comunica com outros, mas também em como você internaliza e ‘assume’ o papel que deseja desempenhar e o valor que está trazendo para uma equipe ou organização.
Fazer uma pesquisa de mercado e entender que setores estão em crescimento ou se alinham com suas ambições e capacidades. Tomar decisões que se alinhem com os pontos fortes, valores e prioridades que você identificou em sua exploração. E negociar uma remuneração que reflita o valor que você pode trazer.
Embora você possa pensar nessas fases como uma sequência, eles são quase sempre iterativos. Explorar suas habilidades e objetivos também te ajuda a ter compreensão da proposta de valor única que você traz para uma organização. E você vai reformular e melhorar sua narrativa e abordagem muitas vezes ao longo de sua carreira.
À medida que avaliar oportunidades e propostas, vale refletir sobre seus pontos fortes e valores para garantir que seu caminho esteja alinhado.
Além desses passos, a gente sugere que você procure:
Em muitos casos, a reinvenção profissional exige reaprendizado profissional. Isso pode incluir cursos técnicos, certificações ou até uma nova graduação.
Converse com pessoas da área desejada, participe de eventos e busque mentores que já passaram pela transição de carreira. Essa rede pode abrir portas e oferecer conselhos valiosos.
Esses são alguns livros que podem te inspirar na sua transição de carreira:
Além de planejar, é importante executar sua transição avaliando os riscos e retornos de dar cada passo:
Estabeleça etapas claras: em quanto tempo pretende iniciar a transição? Quais competências precisa desenvolver até lá?
Guardar uma reserva que cubra de 6 a 12 meses de despesas básicas traz tranquilidade para arriscar novos passos sem pânico.
O mercado muda rápido, e o reaprendizado profissional deve ser contínuo, mesmo após a mudança.
Muitos profissionais fazem cursos, freelas ou projetos paralelos enquanto ainda estão em seus empregos atuais, testando aos poucos o novo caminho.
Martha Stewart – corretora de valores → empreendedora e apresentadora
Antes de se tornar referência em culinária e estilo de vida, Martha Stewart trabalhava como corretora na bolsa de Nova York. Só depois dos 30 anos decidiu investir na paixão por decoração e gastronomia, criando um império midiático.
Jeff Bezos – executivo de Wall Street → fundador da Amazon
Bezos trabalhava como vice-presidente de uma gestora de investimentos. Abandonou a carreira financeira estável para criar uma livraria online em 1994 — a Amazon, que depois se tornou uma das maiores empresas do mundo.
Vera Wang – jornalista → estilista de moda
Aos 40 anos, depois de anos como editora da Vogue e repórter esportiva, Vera Wang decidiu seguir sua verdadeira paixão: a moda. Hoje, é uma das estilistas mais influentes do mundo.
Julia Child – secretária governamental → chef de cozinha e escritora
Julia trabalhou em funções administrativas para o governo americano até os 30 anos. Só depois de estudar culinária em Paris reinventou sua trajetória e se tornou uma das chefs mais famosas da história.
Howard Schultz – vendedor de máquinas de café → CEO da Starbucks
Schultz começou sua carreira vendendo máquinas para escritórios. Ao conhecer a pequena cafeteria Starbucks, enxergou um potencial de expansão e decidiu investir no negócio, transformando-o em uma marca global.
O processo exige autoconhecimento e resiliência, características que fortalecem não só sua vida profissional, mas também a pessoal.
Trabalhar em algo alinhado aos seus valores e paixões reduz o estresse e aumenta a sensação de realização.
A transição de carreira expande horizontes e conecta você a pessoas e experiências que antes não faziam parte do seu cotidiano.
Leia também: Como transformar habilidades e hobbies em dinheiro
Insatisfação constante, falta de desafios, desalinhamento de valores e problemas de saúde mental ligados ao trabalho estão entre os principais sinais.
O segredo está no planejamento: preparar uma reserva financeira, adquirir novas habilidades e buscar apoio em redes de contato.
Nem sempre. Muitas áreas aceitam cursos livres, certificações ou mesmo a experiência prática como forma de transição.
Comece com autoconhecimento, pesquise áreas promissoras, invista em formação e organize sua vida financeira antes de dar o salto.
Sim. Em muitos casos, é preciso começar em cargos iniciais, mas o aprendizado prévio pode acelerar seu crescimento na nova área.
Áreas como tecnologia, saúde, marketing digital, sustentabilidade e diversidade organizacional estão em expansão.
Reconheça que o caminho é seu. Explique sua decisão com clareza e busque apoio em pessoas que compreendem sua escolha.
Invista em autoconhecimento, converse com mentores e experimente atividades paralelas que possam indicar novos rumos.