Márcio Fernandes começa a palestra pedindo desculpas ao público, mas diz que não fará sua apresentação do palco. “Todo mundo diz que o CEO é um cara solitário, que tem poucos amigos, e que decide sozinho. Essa solidão é algo que eu não quero para mim, e por isso não consigo ficar sozinho no palco”, afirma. Em vez disso, ele faz a palestra andando no meio da plateia, e realiza algumas interrupções breves para cumprimentar algum conhecido entre o público. Presidente da Elektro, Marcio Fernandes ficou conhecido pelo seu ‘novo modelo de gestão’, em que afirma que a felicidade dá lucro.
“O modelo antigo de ‘missão, visão e valores’ já não funciona mais há muito tempo”, afirma ele. “Não podemos achar que uma pessoa vai chegar na empresa, nós vamos dar um quadro para ela com ‘missão, visão e valores’ e ela a partir daquele momento precisará seguir aquilo. A resposta óbvia é não, mas é claro que a pessoa não verbaliza”. Segundo ele, não se pode acreditar que a pessoa que acabou de chegar vai ter conexão com a empresa, “não adianta achar que logo na hora que entra o colaborador já vai vestir a camisa”.
“É preciso sair do tradicional. Todo mundo, nos últimos 50 anos, tem feito o mesmo. Raríssimas pessoas fizeram diferente, mas precisamos hoje de um novo modelo de gestão”, afirma. “Ninguém trabalha para encher o bolso do chefe, as pessoas querem encher o bolso delas. Não dá para achar que esse funcionário vai vestir a camisa. Vamos ter a decência de conversar e entender o outro”, completa.
Propósito
Para Fernandes, para conseguir engajar os funcionários, é preciso ter um propósito. “Eu gosto sempre de citar uma frase do Viktor Frankl, que é ‘quem tem um porquê enfrenta qualquer como’. Isso é o propósito”, diz. Quando empresas e pessoas têm propósitos, argumenta ele, só é necessário encontrar a convergência entre os dois. “Preciso que as pessoas entendam que não vamos julgar ninguém, vamos ouvir o propósito, e te ajudar com interesse genuíno — que significa falar o que precisa ser dito e se expor”, afirma Marcio Fernandes. “Para conseguir isso, o único insumo necessário é que a pessoa queira”.
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Isso permite que profissionais e empresas comecem a trilhar caminhos que sejam viáveis, diz Fernandes. “Com isso, as pessoas ficam mais felizes, deixam de ser alguém que está lá porque é obrigado e passam a ser alguém que escolheu aquilo para a vida dela”. Isso constrói a ideia de que o sonho de cada colaborador é respeitado, e que a empresa vai ajudá-lo a apresentar possibilidades viáveis de alcançar esse objetivo.
Ele usou como exemplo uma ação da Elektro. “Temos a lei do menor aprendiz, que diz que precisamos contratar jovens. Mas, ao mesmo tempo, temos na empresa funcionários que têm como propósito ajudar crianças de um abrigo. Como convergir isso? Agora, contratamos meninos e meninas que vivem em abrigos. Eles aprendem uma profissão com os colaboradores da Elektro, que, de forma voluntária, ajudam a ensinar esses jovens”.
“Fazer lucro é trivial”
“Uma pessoa não precisa ser genial para fazer lucro, ainda mais em um país [como o Brasil] que precisa de tanta coisa. O ponto central é como vamos fazer lucro, por quanto tempo, e com qual reputação”, afirma. A questão, segundo Marcio, é como as empresas podem ajudar a construir uma sociedade diferente. Isso, defende ele, pode inclusive fazer com que um consumidor procure o produto da sua empresa em vez de outra, inclusive internacional.
Mudanças necessárias
Para conseguir implementar esse novo modelo de gestão sugerido por Marcio Fernandes, é preciso realizar mudanças dentro da empresa. Na chefia, ressalta ele, é necessário ter líderes facilitadores, e não chefes. “Não pode ser uma pessoa que centraliza poder, mas, sim, que agrega”. Além disso, “a liderança tem que estar comprometida com o desenvolvimento e isso significa segurar o ego”.
Na área da comunicação, é preciso criar um processo transparente, frequente, fluente e bilateral. “Acabamos com avaliação de desempenho. Isso dava um trabalhão e não servia para nada. Você coloca um rótulo na pessoa e ela demora um ano para conseguir tirar esse rótulo. Trocamos por um diário de bordo, que é frequente, transparente e bilateral”.
Por fim, Marcio afirmou que as empresas precisam ter em mente que os processos necessitam ser mudados. “Processo serve para ser jogado fora e ser reescrito constantemente, mesmo quando está dando certo. Queremos ter processos bons, organizados e mutáveis”.
Artigo originalmente publicada na Época Negócios Online.