Graduada em administração pela Fundação Getúlio Vargas, Danielle Brants tinha caminhos bem definidos a seguir. Seguindo a trilha dos estágios que realizou, saiu da faculdade direto para o mercado financeiro, onde seu plano de carreira em Fusões e Aquisições também avançava de acordo com o planejado. “Eu nem questionava, só seguia. O sistema vai te promovendo e você passa a achar que é boa naquilo – mas não necessariamente é daquilo que você gosta”, analisa.
Era outubro de 2007 quando um dos seus superiores saiu do banco em que trabalhavam e a convidou para fundar uma empresa de capital de risco. Danielle topou e, por um ano, planejaram e prepararam o fundo de venture capital para um road show para investidores, agendado para setembro de 2008. Fatidicamente, naquele mês o banco Lehman Brothers quebrou, no estopim da crise de crédito nos Estados Unidos. “Pela primeira vez, vi que o risco – de que tanto falávamos – se materializava”, relembra. Seria impossível, naquele cenário econômico, captar fundos para manter a empresa.
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Resignada, voltou a trabalhar com Fusões e Aquisições em uma boutique financeira. Promovida, virou sócia da empresa. Ainda insatisfeita, porém, decidiu deixar de ser intermediária e, em um passo completamente fora da curva, foi trabalhar na General Electric, no setor de Desenvolvimento de Novos Negócios. “Hoje, conhecendo quem eu sou, percebo que nunca daria certo na GE. É uma empresa que tem 10 mil funcionários no Brasil, uma matriz em que você responde a três chefes, muitos relatórios, apresentações… Eu adorava o que estava aprendendo – produtos tecnológicos, software, máquinas e turbinas – mas não era pra mim”, reflete.
Danielle nunca conseguiu tocar dois projetos em paralelo – muito focada, ela se dedica de corpo e alma à trilha que escolheu seguir. E é por isso que a decisão que tomou ao sair da GE foi tão importante: “Decidi parar. Tirar alguns meses para entender o que gostava e o que queira fazer. As pessoas achavam que estava louca quando pedi demissão, todos me perguntavam onde eu ia trabalhar e eu respondia que não ia para lugar nenhum”.
Seu período sabático de seis meses, porém, não seria de descanso. Comprometeu-se a conhecer uma pessoa nova todos os dias, ou, ao menos, a conversar com alguém que estivesse fazendo algo novo. Entre essas conversas, entrou em contato com Eduardo Bontempo, co-fundador da startup Geekie, com quem tinha trabalhado durante a faculdade. “Conversamos bastante sobre como era trabalhar com educação e ele me aconselhou: ‘Dani, para fazer a transição, burn the bridge. Queime a ponte com o seu passado, não olhe pra trás’.“
Ela queimou. Um curso em Harvard a ajudou a entender o mercado e as perspectivas para quem desejava empreender na área. “Percebi que as pessoas estavam trabalhando com ensino adaptativo em várias disciplinas ao mesmo tempo, e decidi que queria ser mais específica, me dedicar exclusivamente a uma competência: a leitura”. Danielle constatou que o letramento ainda era feito de forma muito intuitiva, e que tecnologias computacionais poderiam ajudar a criança a passar por este processo, através da medição da complexidade de um texto e mapeamento do aprendizado.
Decidiu desenvolver, então, o primeiro software do tipo em língua portuguesa – nascia, com isso, a Guten Educação. Voltando ao Brasil, Danielle pesquisou tudo o que pôde sobre o assunto. “Uma coisa boa é que, como não sabia nada, tive muita humildade para estudar e conversar com as pessoas – fui descobrindo, no processo, do que precisava”, explica. Ao procurar estudos sobre o tema, encontrou uma publicação científica do grupo de pesquisa em Linguística Computacional da USP de São Carlos. Fechou parceria com eles para o desenvolvimento do software classificador e, paralelamente, já começou a trabalhar em outros produtos complementares: um aplicativo de notícias adaptadas à linguagem infantil e outro mapeador de habilidades.
“Trazer parceiros foi um salto, e sou muito feliz com a escolha que fiz”, afirma. A Guten já recebeu o aporte financeiro de investidores-anjo, da Artemisia Ventures e, recentemente, do fundo norte-americano Omidyar Network, focado em empresas com alto impacto social. Em novembro de 2015, Danielle foi escolhida pela MIT Technology Review como um dos 10 brasileiros mais inovadores com menos de 35 anos, e selecionada pela mesma publicação como o Inovador Social de 2015.
Com dois produtos no mercado e o terceiro com lançamento em 2016, ela sente que, finalmente, está investindo seus talentos e seu esforço em algo em que se vê: “Toda vez que vejo uma criança usando nosso software, e mostrando seu progresso para os pais e para os professores, me pergunto por que não mudei antes. Mas entendo que era uma trajetória necessária para chegar mais madura a esse momento.”