Oito em cada dez jovens consideram namorar uma IA — e isso deveria acender um alerta sobre o futuro do trabalho e das relações humanas. O diagnóstico é de João Vitor Marinho, diretor de Pessoas da Ambev, que aos 32 anos já entendeu algo crucial: em um mundo onde a inteligência artificial vira commodity, são as conexões genuínas que fazem a diferença. Da engenharia de petróleo ao RH, da primeira liderança aos 23 anos até a paternidade recente, ele construiu uma trajetória baseada em escuta ativa, protagonismo e uma premissa simples: liderança não é sobre cargo, é sobre impacto.
João Vitor Marinho compartilhou sua trajetória profissional e lições valiosas sobre carreira e liderança em uma sessão do curso Carreira de Excelência Na Prática. Combinando experiências pessoais e profissionais, Marinho ofereceu uma visão inspiradora sobre como liderar com propósito.
Da engenharia ao RH
Apaixonado por ciências exatas, João Vitor ingressou no curso de Engenharia de Petróleo aos 16 anos, movido pela expectativa de uma carreira financeiramente promissora. Mas logo percebeu que o setor era técnico demais para seu perfil.
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Mesmo assim, terminou a graduação e passou a buscar oportunidades em programas de trainee. Sonhava com a Ambev, e, mesmo sendo reprovado na etapa final do processo, recebeu uma semana depois um convite para atuar como analista na área de Gente (RH). Sem saber exatamente o que significava “gente e gestão”, aceitou o desafio. “Foi paixão à primeira vista pela cultura da Ambev, pela área de gente”, conta.
Essa decisão, considerada inusitada por quem o conhecia, se mostrou um ponto de virada. João Vitor encontrou propósito no contato com pessoas, no desenvolvimento de lideranças e no impacto direto no crescimento do negócio. Desde então, construiu toda sua trajetória dentro da área de RH da Ambev, recusando propostas de migração para outros setores.
Liderança humanizada: começa pela escuta
Aos 23 anos, assumiu sua primeira posição de gerência, liderando, inclusive, pessoas mais velhas e experientes. Sem “muita técnica”, apostou na empatia como guia. Um dos casos mais marcantes foi o de uma colaboradora que sonhava em ser enfermeira com mais de 60 anos. Ao ouvi-la de verdade e flexibilizar sua jornada, João Vitor ajudou a tornar o sonho realidade, e ela se aposentou para iniciar uma nova carreira.
“O principal foi começar pela empatia pela escuta”, conta. Para ele, liderar é, acima de tudo, aprender com as experiências, inclusive com as difíceis, como desligamentos. “Com o tempo, a gente entende que algumas decisões duras são as melhores para a pessoa, para você e para a empresa”, reflete.
Protagonismo na crise
Logo no início da carreira, João Vitor foi responsável por um turnaround em uma operação da Ambev em crise. Diagnosticou problemas de comportamento e engajamento na liderança, além de resultados comerciais negativos. Com decisões difíceis e foco nas pessoas certas, conseguiu reverter o cenário com resultados expressivos.
Outro momento marcante foi em 2019, quando ajudou a reposicionar a reputação da Ambev, então vista como uma empresa “agressiva”. Inspirado em universidades americanas, criou um programa de alumni para ex-funcionários, promovendo reconexão com talentos e transformando-os em embaixadores da marca. A iniciativa envolvia testes de inovação e manutenção de benefícios, reforçando a cultura de autonomia e informalidade da empresa.
Tempo, paternidade e o valor das prioridades
Organizado com a agenda, João Vitor acredita que delegar e confiar no time são essenciais para avançar na carreira. A paternidade, com o nascimento da filha Maria Clara, intensificou esse olhar: “Não me permito mais perder cinco, dez minutos do dia, porque sei que são minutos a menos com minha família”. Com prioridades redefinidas, ele busca formas mais inteligentes e humanas de alcançar seus objetivos.
IA e o futuro do trabalho
Sobre a Inteligência Artificial, João Vitor foi direto: “Vai estar em todo lugar e virar quase que commodity”. Para ele, o profissional do futuro precisa ser proativo: “Não fiquem esperando alguém ensinar formalmente sobre IA. Busquem por conta própria”. A tecnologia, segundo ele, será uma aliada poderosa — mas não substitui o que há de mais humano: a capacidade de se conectar genuinamente com os outros.
É justamente nesse ponto que ele faz um alerta. Em um mundo cada vez mais automatizado, onde vínculos digitais se tornam comuns, cultivar relações reais se torna ainda mais essencial. Networking, para ele, se constrói com reputação pessoal — feita de ética, entrega e autenticidade. Marinho chama atenção para a crise de saúde social que afeta muitos jovens, marcada por isolamento, burnout e até relações artificiais: “Oito a cada dez jovens hoje consideram namorar uma IA”, comenta. Na visão dele, conexões verdadeiras, baseadas em confiança e pertencimento, são o antídoto para esse cenário e um pilar para uma carreira sustentável.
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O protagonismo começa onde você está
Para quem almeja cargos de liderança, João Vitor deixou um conselho direto: “Busque a liderança no lugar onde você está. Porque não é sobre o cargo, é sobre o impacto que você gera”.
Isso inclui assumir projetos, cuidar do clima da equipe, propor soluções e ouvir com atenção. A liderança, segundo ele, é uma prática cotidiana, feita de atitude, intenção e conexão genuína com as pessoas.