Geraldo Campos é professor de empreendedorismo na Universidade do Sul de Santa Catarina (UniSul) e, como muitos de seus colegas, vê semestralmente a adição dos trabalhos de conclusão de curso (TCC) dos universitários às bibliotecas do local.
Depois de apresentados, muitos deles param ali mesmo, onde são – às vezes – consultados por outras pessoas. Caso os próprios alunos não levem suas ideias para frente, acabam ficando em algum lugar na prateleira.
Esse destino incomodava Geraldo. Para combatê-lo, criou as iniciativas TCC Startup, que alia conhecimento aplicado e problemas reais de startups, e o iLab, o laboratório de inovação e empreendedorismo local que ajuda os empreendedores a continuarem desenvolvendo seus projetos.
Leia mais sobre a experiência abaixo:
Como surgiu o TCC Startup
Desde que comecei a lecionar em graduação — já há 17 anos –, havia algo que me incomodava: os destinos dos Trabalhos de Conclusão de Curso (TCCs) produzidos pelos alunos. Chamava-me a atenção o fato de que o aluno passava um, dois anos pesquisando um tema de que (provavelmente) gostava, apenas para que o projeto fosse ocupar uma prateleira na biblioteca, e nada mais. Para mim, não fazia sentido que isso ocorresse, que tantas boas ideias deixassem de ser colocadas em prática.
O TCC Startup, projeto de fomento à cultura empreendedora que desenvolvemos na UniSul (Universidade do Sul de Santa Catarina), nasce desse incômodo. Mas não só dele: surge também dos desejos de alguns alunos da universidade, que queriam transformar seus projetos em realidade, aplicá-los para resolver um problema de mercado – mas que não tinham ideia de como fazer isso.
Além disso, o TCC Startup também tem origem com uma pergunta: por que não usar, como desafio para os TCCs, os problemas enfrentados por startups vinculadas à incubadora da universidade? Afinal, se já havia organizações reais, com problemas reais, poderíamos aproveitar isso para preparar melhor os alunos.
Baixe o ebook: 10 dicas para quem quer empreender
Muito além do diploma
Logo foi se consolidando, então, a ideia de criar, dentro da universidade, um “gerador de insumos” para solucionar essas questões. Para as startups, a proposta era oferecer soluções para os desafios de gestão; para os alunos, oportunidades de aplicar ideias — e de empreender, de fato. O grande objetivo, desde então já claro para nós, era preparar o aluno não somente para um diploma, mas para um projeto de vida.
Assim, em 2015, elaboramos um piloto do TCC Startup e fomos apresentando à diretoria da universidade. Naquele momento, adotamos a seguinte metodologia: transpor as premissas necessárias de um TCC tradicional para um modelo de negócio.
Hipóteses que podem virar produtos ou serviços
O processo era simples: o aluno devia, a partir da “pergunta-problema” de seu TCC, indagar-se se essa questão poderia ser respondida por um plano de negócio. Ele deveria se questionar sobre a possibilidade das hipóteses levantadas se transformarem em produtos ou serviços. O foco era auxiliar esse aluno a aplicar suas ideias, transformando-as em negócios.
A aplicação que desenvolvemos se dá por meio do auxílio aos alunos em algumas das cinco etapas que, a nosso ver, constituem o processo do empreendedorismo — e que aplicamos a todos os negócios aqui no iLab, o laboratório de inovação e empreendedorismo que também criamos na Universidade.
As fases são as seguintes: a primeira é o desenvolvimento da ideia e do modelo de negócio; a segunda tem como foco o desenvolvimento de protótipos, de MVPs etc; a terceira fase é a de experimentação e validação de mercado (a conquista de seus primeiros clientes); na quarta fase, tem-se uma estruturação do negócio, da equipe, com CNPJ, e por aí vai — é quando a startup vira uma empresa; e a quinta fase é a de ganho de mercado e escala.
Começa no TCC Startup e continua no iLab
Com o TCC Startup, os alunos chegam até a segunda fase, a de protótipo. Assim, ao longo da elaboração do Trabalho de Conclusão de Curso, os estudantes são acompanhados pelos professores dos cursos nos quais vão se graduar e pelos professores do iLab.
E quando os alunos concluem o TCC, eles podem dar sequência ao desenvolvimento do protótipo por meio do iLab, que os auxiliará naquelas outras etapas de negócio.
Aquele meu incômodo de ver tantos trabalhos acabando na biblioteca da universidade logo ganha uma nova solução. O trabalho de conclusão se torna apenas o início do processo de levar a ideia para a prática!
Mentorias para colocar as ideias em prática
Uma vez no iLab, os alunos recebem todo o amparo para dar sequência ao desenvolvimento. E o apoio se dá por meio de mentorias — não apenas dos professores do laboratório de inovação, mas de empreendedores, gestores e outros participantes de nossa rede. A ideia é prepará-los da forma mais consistente possível para os problemas reais de mercado, conectando-os com quem já viveu na pele os desafios.
No fundo, queremos mesmo é conectar os alunos à atividade empreendedora. E essa conexão, como dissemos, acontece já ao longo do TCC Startup. De fato, nas aulas em que os alunos recebem os problemas reais de startups ligadas à UniSul, os empreendedores aparecem para trabalhar lado a lado com os grupos. E nas mais diversas áreas, da comunicação à engenharia.
Aprendizados para os alunos, braços para os empreendedores
Assim, ao mesmo tempo em que o aluno aprende sobre o que deu certo em grandes organizações, como Facebook e Google, ele tem a oportunidade de viver mais a nossa realidade. De confrontar desafios que estão muito mais próximos dele. Já os empreendedores, ganham “braços extra” para tarefas que, devido ao tamanho limitado de suas equipes, antes não conseguiam realizar.
Hoje, são mais de 180 alunos em dez disciplinas trabalhando em conjunto com empreendedores no TCC Startup. E os professores envolvidos com o projeto são sempre convidados para compor os TCCs de outros cursos, de modo a auxiliar os alunos a viabilizar suas ideias.
De minha parte, fico satisfeito por constatar que a educação empreendedora vem ganhando mais e mais espaço. E por imaginar que aquela prateleira da biblioteca possa estar cheia não só de boas ideias, mas de bons produtos e serviços.
Artigo originalmente publicado pela Endeavor