Por Leticia Moraes
Empreendedora, sócia fundadora de um escritório de contabilidade, CEO da startup de tecnologia G-Click, mulher e mãe… Entre tantos papéis, Cristiane Andrade sabia desde muito cedo que o trabalho seria parte fundamental da sua vida.
Quando criança, ela lembra que sonhava em começar a trabalhar e brincava de comandar a sua própria empresa.
Cursou Administração e começou a atuar no setor privado. Já nessa época, buscava trazer inovações, desenvolvimentos e melhorias para os processos internos.
“Eu percebi que estava empreendendo dentro da empresa em que eu trabalhava e vi que era hora de montar um negócio. Eu queria empreender buscando o meu propósito. Comecei pelo porquê. Não empreendi porque estava sem dinheiro ou porque simplesmente tive uma ideia. Sempre acreditei que o caminho de sucesso para negócios que transformam o status quo e deixam um legado era o trabalho colaborativo e isso não era o que eu via no dia a dia da empresa que eu trabalhava”, conta.
Seu propósito era auxiliar o crescimento de outros negócios e do próprio país e para conseguir alcançá-lo, viu no mercado contábil uma oportunidade.
Foi assim que, em 2003, Cristiane Andrade abriu a Confiare, escritório de contabilidade com sede no Rio de Janeiro, que atualmente conta com uma equipe de mais de 35 colaboradores.
Leia também: 6 podcasts sobre empreendedorismo e negócios
No começo, ela e o seu sócio Arnaldo dos Santos Júnior, contavam com a ajuda de apenas dois colaboradores. O mais importante foi agir com os recursos que tinham, executando e aprendendo com os erros.
“Pesquisei o mercado e fiz um plano de negócios para 5 anos. Mesmo sem grana, é importante você conhecer as ferramentas para saber se o seu caminho é viável, além de acreditar no seu projeto.”
Desde o início, ela sabia que o diferencial do seu escritório seria o foco no trabalho digital.
“Há 17 anos, tudo era em papel e eu entendia que a gente tinha que ser diferente. Eu tive que ensinar os clientes a enviarem arquivos em pdf… A empresa nasceu com a mentalidade de trazer essa mudança e sabíamos como faríamos isso. A ideia era ser realmente disruptivo”, conta.
De empresária contábil a CEO de startup
Por ser a fundadora de um escritório de contabilidade que tem como diferencial a tecnologia, Cristiane sempre esteve em busca de novas soluções e muito focada em inovação.
Foi essa inquietação que a levou até o seu novo sócio, Richard Werneck. Por ser contador e engenheiro de computação, com experiências no Vale do Silício, ele utilizava alguns softwares próprios no escritório de contabilidade da família.
Quando ficou sabendo disso, Cristiane viu a oportunidade de também testá-los em sua empresa. Então, ela se apresentou e os dois começaram a trocar ideias.
“Um ano depois ele me enviou um protótipo de um gestor de tarefas. Começamos a usar e quando eu vi funcionando, pensei que todos os escritórios de contabilidade precisavam disso. Para mim o objetivo sempre foi compartilhar o conhecimento e facilitar a vida de outras pessoas e empresas. Nunca foi reter, e sim disseminar novas e melhores formas de fazer as coisas “.
Os dois, então, fizeram um novo produto do zero, para ser comercializado, a partir do que já haviam testado e aprendido com o protótipo.
Assim nasceu a G-Click, plataforma web para gestão de tarefas e projetos direcionado para contadores.
O software centraliza todas as informações dos escritórios e permite que os gestores saibam exatamente qual é a sua realidade, enquanto todos os funcionários podem visualizar o que precisa ser feito, prazos e o status de cada tarefa.
“Olhei de novo para o meu propósito de impactar negócios. Acredito que qualquer empresa pode trabalhar de forma compartilhada com a sua equipe. É isso que vai gerar um crescimento exponencial. Por que não ter uma ferramenta para facilitar? E a nossa faz exatamente isso: ajuda a equipe a interagir em alta performance para potencializar os resultados.”
Unindo o conhecimento do mercado contábil e a vontade de transformar a realidade de mais empresas, a G-Click se tornou a primeira startup investida pela Omie Ventures.
Para Cristiane, o sucesso está na capacidade da equipe em ter velocidade na correção dos erros e nos aprendizados adquiridos a partir deles:
“Quanto mais rápido o empreendedor entender o que, porquê e como errou, mais rápido vai conseguir mudar e testar uma nova fórmula para alavancar aquele ponto específico do negócio’, explica.
Por onde começar a empreender?
Para quem está no início da sua trajetória como empreendedor, Cristiane destaca que é importante saber exatamente o porquê, como e o que você vai entregar.
“Depois você coloca a mão na massa, se conecta com as pessoas certas com clareza e tudo acontece. Quem é empreendedor de verdade topa correr risco calculado e busca autonomia… Errou? Aprende e vamos embora! Quando procuramos culpados, não aprendemos e não nos desenvolvemos!”.
Ela também destaca a importância de crescer com sustentabilidade e de ter humildade para seguir aprendendo.
“Hoje é muito fácil buscar conteúdos que podem ajudar! Lá atrás, eu fiz o meu plano de negócios em Excel e sempre fui muito focada em processos. Mesmo quando a empresa era pequenininha, eu tinha todos eles mapeados… É assim que se cresce de maneira organizada!”
Olhando para a sua história, outro ponto que Cristiane considera importante é entender qual é o seu papel diante do negócio e também da equipe. Por muitas vezes, ela achou que precisava dar conta de resolver e de fazer tudo por ser a CEO.
Acabou descobrindo que não era bem assim:
“Como empreendedor, não seja um super herói e nem tente carregar o mundo nas costas! Quando se trabalha de forma colaborativa, tratando adulto como adulto e não como criança, o crescimento e a velocidade são muito maiores e muito mais recompensadoras para todo mundo!”
Quebra de paradigmas e representatividade
Um estudo feito pelo Conselho Federal de Contabilidade mostrou que o número de mulheres atuando na contabilidade vem aumentando consideravelmente.
Em 2009, elas representavam 25,40% entre o total de profissionais. Em 2018, esse número cresceu para 42,79%.
Apesar disso, Cristiane ressalta que são poucas as mulheres que ocupam posições societárias. A maioria delas atua na liderança de setores como o contábil, o fiscal ou o departamento pessoal.
Leia também: Pesquisa da McKinsey reafirma ligação entre diversidade e rentabilidade nas empresas
No mercado de tecnologia a situação não é muito diferente.
A mais recente Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio do IBGE, mostrou que só 20% dos profissionais que atuam no mercado de TI são mulheres.
O mesmo estudo apontou que as profissionais de TI do sexo feminino têm grau de instrução mais elevado do que os homens do setor no Brasil, mas, mesmo assim, ganham 34% menos do que eles.
“Eu não conheço nenhuma outra mulher sócia de uma startup de tecnologia. Acho que a cultura latina, do papel da mulher no Brasil e na família, tem um grande impacto nisso”.
Empreendendo em dois ambientes com maioria masculina absoluta, Cristiane acredita que o mercado precisa ser trabalhado para fazer com que as mulheres se sintam mais confortáveis e livres para fazerem as suas escolhas.
Além disso, diz que as próprias mulheres precisam buscar o equilíbrio para deixar a culpa de lado.
“É muita cobrança: será que eu cuido do meu filho ou vou pro trabalho? Será que chego em casa mais tarde? Isso ainda pesa muito… E em alguns momentos você vai ter que escolher sim. O importante é fazer a escolha com o coração”.
“Empreender é um ato familiar!”
Além de empreender, ter uma família também sempre esteve entre as escolhas de Cristiane.
Quando abriu a Confiare, ela já era mãe, e um ano depois de iniciar a carreira de empreendedora teve o seu segundo filho, porque não queria ser mãe depois dos 35.
“Foi uma época em que eu parei para refletir, pensar em mim e no que eu queria para a minha vida. Empreender é um ato familiar! A família precisa entender. Porque para quem empreende, o trabalho não é um sofrimento, é algo que você gosta muito!”
Por outro lado, nos momentos reservados para aproveitar com a família e com os filhos, Cristiane diz que o essencial é estar totalmente inteira: “Não adianta ficar com eles e não estar com o coração e a mente presentes”.
Tanto nos negócios quanto na vida pessoal, a bússola que guia as suas escolhas e as suas tomadas de decisão, é o propósito.
“Os momentos de maior indecisão de qualquer pessoa são quando ela não consegue entender o seu propósito. Qual é o seu papel na família? E no trabalho? Se não sabe, empaca. Fica sem ação e sem saber o que fazer… O que te move é uma coisa só: o propósito!”
E você? Tem vontade de ter o próprio negócio? Já descobriu o seu propósito?