“Quando coloco meu iPhone e meu Windows Phone na mesa, a reunião para”, brinca Paula Bellizia, presidente da Microsoft Brasil há um ano. É também uma mensagem sobre “a nova Microsoft”, que hoje se vê como um meio e não como um fim.
Ela explica: não se trata mais de colocar um PC em cada mesa e democratizar a tecnologia – a primeira intenção da empresa, quando ainda crescia dentro de uma garagem –, mas de empoderar pessoas e organizações a fazer mais com a tecnologia.
Ter um leque muito mais amplo que nos dias de startup ajuda. Além de software e hardware (que hoje incluem tablets e celulares), a Microsoft hoje oferece videogames, soluções para negócios, servidores, ferramentas de desenvolvimento e serviços de nuvem, entre outros. Em 2015, faturou cerca de US$ 93,5 bilhões.
Essa nova missão corporativa, que vem tomando forma nos últimos anos, foi parte do que fez Paula aceitar o cargo. “A empresa está abrindo sua plataforma e era o momento de viver a transição”, diz, destacando o uso crescente de open source.
Formada em Computação e Ciência da Computação na Unesp, Paula fez pós-graduação em Marketing na ESPM e MBA na FIA/USP. Começou trabalhando na área de Marketing da Whirlpool, onde ficou por sete anos. Em seguida, foi gerente de grupo de produtos na Telefônica por dois anos antes de se juntar à Microsoft.
Ocupou os postos de gerente de vendas para pequenas e médias empresas e diretora de marketing e operações, e saiu com uma década de casa. Após um breve período no Facebook, assumiu a presidência da Apple no Brasil e ocupou a cadeira por outros dois anos.
Planejava um período sabático quando recebeu o convite da Microsoft, com quem sempre manteve uma política de portas abertas. “Um dia, recebi uma ligação e me disseram: ‘Vem ser a líder no Brasil’. Não dormi!”, ri.
Juventude
Dentro do campo de responsabilidade social, os principais focos de Paula no Brasil são os setores de educação e empreendedorismo, que têm grande potencial de impacto e podem melhorar cenários em grande escala.
De projetos de apoio à qualidade do ensino e acesso facilitado a tecnologias nas escolas públicas às incubadoras e competições de startups como a Imagine Cup, a ideia da Microsoft é ajudar a juventude brasileira a se desenvolver usando as plataformas da empresa – e assim se consolidar cada vez mais no mercado.
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Ela também aponta que a maior parte dos empreendedores do país é jovem e que cerca de 60% dos universitários brasileiros querem ter seus próprios negócios no futuro.
Ou seja, não vão faltar clientes em busca das ferramentas tecnológicas corretas no futuro próximo.
Em código
Num mundo cada vez mais tecnológico, faz todo sentido propagar a importância da programação. Mais que importante, ela se torna na verdade fundamental. De acordo com empregadores como Paula, programar já é uma habilidade básica da força de trabalho atual.
A presidente conta que sua filha, de 8 anos, já demonstrou entusiasmo pela linguagem. Faz bem. “As instituições de ensino estão à frente de um grande desafio, que é formar jovens com competências específicas para o século 21”, diz. “E aprender a programar permite que os usuários se tornem criadores e desenvolvedores de tecnologia, além de acelerar o desenvolvimento de suas carreiras. É uma grande oportunidade para os jovens.”
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Fazer uso inteligente de tecnologia em salas de aula, como incluir programação na grade curricular, também pode preencher lacunas educacionais e potencializar cada vez mais os alunos.
“A linguagem de programação, por exemplo, contribui para desenvolver em crianças e jovens o raciocínio lógico e a habilidade para resolver problemas, uma vez que exercita capacidades cognitivas básicas para enfrentar a realidade complexa que os rodeia.”
Liderança
Para Paula, a capacidade de solucionar problemas lógicos é característica essencial de um bom líder, assim como criatividade, boa comunicação, abertura, foco no resultado e pensamento crítico.
E como é impossível acertar o tempo todo, aprender com os erros é fundamental. “Na Microsoft, nossa cultura é fundamentada na mentalidade de crescimento, que é a crença de que você pode aprender sempre”, resume. “Para isso, é necessário assumir riscos e mover rapidamente quando cometemos erros, reconhecendo que as falhas acontecem na jornada para a excelência.”
Ela garante que não faltaram erros e deslizes em sua própria trajetória. “Aprendi que as chances de dar certo com só um número, uma meta ou um jeito de engajar as pessoas são muito pequenas, porque as pessoas pensam: ‘ah, a meta é só dela’”, exemplifica. O que muda é como se encara, e o que se tira, de cada situação.
No dia a dia, Paula opta por uma rotina intensa e estima que passa cerca de 70% de seu tempo fora do escritório. Também é adepta do home office e da flexibilidade, que lhe permitem passar tempo com os filhos – e incentiva sua equipe a fazer o mesmo, desde que estejam online no Skype às 17h. “Acho que temos que rasgar os modelos tradicionais e estou tentando fazer isso, de colocar as cadeiras em círculos a analisar, caso a caso, os trajes de trabalho.”
A mentalidade aberta às mudanças se estende para todas as áreas. Para se manter à frente de uma indústria tão competitiva e disruptiva, é essencial buscar novas maneiras de pensar e produzir. A ideia principal, esclarece, é quem não faz gol leva um.
“As mudanças não só técnicas, mas conceituais, estão cada vez mais dinâmicas, e quem se prende a uma forma de pensar e trabalhar perde oportunidades”, explica. “Estar aberto para crescer e aprender constantemente é, para mim, a forma de se adaptar a esta nova realidade.”
Diversidade
Ter uma presidente mulher significa, na maior parte do tempo, colocar o tema da diversidade em pauta. Num mercado mundial onde as mulheres ainda ocupam apenas 9% das posições de liderança, há uma pressão crescente para aprimorar esse quadro.
“É importante que o líder seja um exemplo das atitudes que acredita e defende”, diz Paula. “Um líder precisa manter uma equipe diversa, e me refiro a experiência, gênero, perfil e idade, refletindo o mercado no qual atuamos para podermos entender melhor as demandas dos consumidores e clientes e gerar criatividade e inovação.”
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Em um país em que 50% das pessoas são mulheres e 53% se identificam como pardos ou negros, ela quer ver este espelhamento dentro da corporação. “Se você não tem essas pessoas representadas, não vai atendê-las bem”, fala. Para garantir que o quadro mude, já instituiu políticas novas no processo de recrutamento, como exigir que haja um homem e uma mulher entre dois finalistas.
Além disso, a Microsoft gerencia programas voltados especificamente para mulheres. Uma campanha de março, #MeninasPodemProgramar, buscou ensinar o básico da linguagem a jovens brasileiras com idades entre 13 e 29 anos.
É uma das maneiras que Paula e sua equipe encontram para tentar engajá-las com a profissão e assim incentivar o crescimento da presença feminina na chamada família STEM, que inclui ciência, tecnologia, engenharia e matemática e onde o gap entre os dois sexos é grande.
“Só quero que a gente traga oportunidades iguais”, resume.
Carreiras
Hoje com seu nome na porta mais importante do prédio, Paula diz que sonhou com o cargo pela primeira vez há muitos anos – e que não poderia ter chegado lá sem a ajuda de outros líderes, como a diretora que a promoveu quando ela estava grávida de sete meses. “Você encontra muita gente que pode transformar sua vida”, diz.
A diversidade de experiências, seja dentro de uma própria empresa ou em várias, é para ela, fonte importante de crescimento. “Não existem duas culturas iguais, mas há aprendizados em todas”, fala. “Isso contribuiu muito para minha visão de mundo e amadurecimento profissional. No mundo da tecnologia, a inovação é palavra de ordem e ela é impulsionada pela diversidade.”
Aos jovens, ela aconselha: assuma riscos e mergulhe de cabeça nas experiências, seja numa empresa, órgão público, ONG ou em seu próprio negócio. Se você mantiver a cabeça aberta, o aprendizado é uma consequência natural. E tome suas próprias decisões. “Sua carreira é 100% sua. Não diga depois que não cresceu porque a empresa não deixou”, resume.
Seja comentando sobre novas iniciativas educacionais, Big Data ou reconhecimento de íris, Paula sabe que ocupa um lugar privilegiado na revolução tecnológica.
Entusiasmada, ela sintetiza: “O futuro é demais”.