A pandemia do coronavírus gerou uma série de efeitos colaterais na saúde mental da população. Mudanças de rotina, estresse, perda de segurança financeira, incertezas, falta de contato afetivo e perda de senso de identidade são alguns dos fatores que agravaram a situação. A forma como indivíduos e organizações lidam com o trauma da pandemia será determinante para o futuro dos negócios e convício social, de acordo com a psicóloga organizacional Lisa Zigarmi e a consultora de negócios Davia Larson.
Em um artigo publicado na Harvard Business Review, a dupla defende que profissionais e gestores devem se preparar para o retorno aos ambientes de trabalhos formais com ferramentas para lidar com o trauma da pandemia. E, de acordo com elas, a forma mais segura e rápida de retomar a produtividade é compartilhando histórias que ativem o crescimento pós-traumático.
O trauma da pandemia e o crescimento pós-traumático
Zigarmi e Lardson definem o crescimento pós-traumático como a experiência de crescimento que decorre da luta contra um trauma. Em outras palavras, é uma mudança positiva e transformadora que pode ocorrer como resultado de uma luta com adversidades. Pesquisas publicadas no Manual do Crescimento Pós-Traumático apontam que pessoas que conseguem encontrar algum sentido no trauma sofrido conseguem as seguintes habilidades:
- Maior senso de força própria e capacidade de prevalecer;
- Melhores relacionamentos com outras pessoas, incluindo maior senso de pertencimento;
- Maior senso de compaixão;
- Maior senso de propósito e apreciação pela vida. estou editando
A dupla cita como exemplo de crescimento pós-traumático no trabalho perder o emprego, mas depois buscar uma nova função que se alinhe melhor com seus pontos fortes e objetivos. Elas também salientam que o trauma não é positivo, mas pode ajudar no desenvolvimento e crescimento de seus sobreviventes.
Com isso em mente, elas propõem que os profissionais encontrem histórias que os definem sobre o trabalho durante a pandemia. Assim, eles conseguem contar as próprias narrativas de novas formas, estimulando o crescimento, o reconhecimento da tristeza e da perda, analisando seus efeitos e internalizando uma resolução positiva que ativa a autotransformação.
Para superar o trauma da pandemia, o sofrimento deve ser reconhecido de forma explícita, como apontam as pesquisadoras. Por isso, eles incentivam profissionais disruptivos a contar histórias para restaurar o bem-estar e reafirmar o senso de propósito enquanto continuam trabalhando em um mundo em transformação.
Contando histórias para crescer
Zigarmi e Larson elaboraram perguntas para ajudar os profissionais a validarem suas experiências com o trauma da pandemia e avançarem de forma construtiva. Ela defendem que os questionamentos podem ser usados com grupos e equipes em todos os níveis da organização. Confira abaixo:
- Qual foi a maior perda que você vivenciou durante a Covid-19?
- Qual foi o maior ganho que você obteve durante a Covid-19?
- O que você está aprendendo sobre você mesmo durante a Covid-19?
- Como seria se você aplicasse esses aprendizados daqui para frente?
- Quais são as duas palavras ou frases curtas que te farão lembrar de como aplicar o que está aprendendo?
A dupla aponta que quando as pessoas compartilham histórias com base em perguntas como essas, são capazes de expressar desde autenticidade e receptividade até confiança e vulnerabilidade. E esse é um processo recíproco que impulsiona a construção de significado para os contadores da história e estimula a apreciação e novas possibilidades para os ouvintes. Confira agora algumas etapas para colocar a ideia em prática:
É preciso selecionar um facilitador para explicar como a dinâmica funciona. As pesquisadores recomendam uma sessão de 2 horas com 4 a 6 participantes. Confidencialidade e participação voluntária são pré-requisitos importantes. Os indivíduos são incentivados a compartilhar histórias que representem suas vivências relacionadas ao trauma da pandemia, identificando o que aprenderam e criando uma orientação interna para reivindicar seus pontos fortes e propósito.
Como aplicar o exercício
As histórias dos participantes devem ser autocentradas e tiradas de experiências diárias. O recomendado é tentar evitar falar sobre algo que aconteceu com parceiros, filhos, chefes ou que foi divulgado na mídia. Alguns relatos podem gerar respostas emocionais, o que é normal e aceito. Além disso, alguns indivíduos podem se sentir confortáveis com a abertura e a vulnerabilidade, enquanto outros nem tanto. A dupla garante que, independente disso, todas as contribuições devem ser ouvidas e respeitadas.
Depois que as histórias forem compartilhadas, os participantes devem escolher duas palavras que resumam o relato e possam servir como um mantra para o futuro pós-trauma da pandemia. Alguns exemplos citados são “gentil e consistente”, “focada e destemida” ou “relaxe e deixe ir”. O objetivo é que o mantra consiga ser integrado à rotina dos profissionais e os ajude a continuar lidando com o trauma da pandemia.
As pesquisadoras ressaltam que o mantra pode mudar de tempos em tempos, conforme o indivíduo cresce e evolui. Portanto, é natural que ele precise ser realinhado, principalmente quando houver mudanças nas circunstâncias que causam angústia. Por fim, se quiserem, os participantes podem compartilhar seus mantras e o significa deles. O facilitador também pode perguntar como o exercício trouxe ideias sobre como as pessoas podem se adaptar ao trabalho depois da pandemia.
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Esse exercício é uma estratégia que as organizações podem adotar para mostrar cuidado e compaixão aos colaboradores. O resultado é de profissionais mais satisfeitos e comprometidos no trabalho e taxas menores de esgotamento e absenteísmo, de acordo com Zigarmi e Larson. A prática pode ser realizada em qualquer lugar, dentro ou entre organizações e estruturas hierárquicas.
Por fim, a dupla finaliza defendendo que aumentar a capacidades dos indivíduos de ouvir e contar histórias faz com que seja possível aprender com o trauma da pandemia e gerar um crescimento significativo durante períodos de incerteza, criando também novas possibilidades para trabalhadores e organizações.