Se olharmos para os números do mercado de trabalho de maneira geral, dos países de terceiro mundo aos mais desenvolvidos, fica claro que a inclusão das mulheres no mundo profissional ainda é um processo em desenvolvimento, e ninguém pode afirmar com convivção que tem o problema resolvido. Ainda assim, o setor de tecnologia aparece como um ponto crítico.
Afinal de contas, por que há menos mulheres trabalhando no setor de tecnologia? Da mesma forma que a pergunta, a resposta também é bastante complexa. Para especialistas, um dos aspectos a serem levados em conta está na juventude — do ensino fundamental ao ensino médio — onde nasce e ganha força a desigualdade entre meninas e meninos.
O psicólogo americano Andrew Meltzoff, ouvido em reportagem do G1, concorda. Ele diz que, aos sete anos, garotas já absorveram dos adultos a ideia de que são inferiores em matemática aos meninos, mesmo que suas notas digam o contrário. Na hora da escolha profissional, isso contribuir para afastar mulheres de cursos como engenharia e ciências da computação, o que também se reflete na quantidade de profissionais do sexo feminino no mercado.
Andrew esteve no Brasil no último mês de julho para participar de conferências sobre estudos do cérebro e de uma mesa redonda da Academia Brasileira de Ciências sobre o aprendizado das disciplinas conhecidas pela sigla em inglês STEM – ciência, tecnologia, engenharia e matemática. “Nos Estados Unidos, as crianças só começam a aprender as operações de multiplicação e divisão no 3º ano. Mas nossas experiências mostram que, antes mesmo de começar a aprender matemática mais complexa, elas já ‘pegaram’ o estereótipo cultural de que matemática é para meninos”, disse, durante a conferência.
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Estereótipos, ele explica, são “imagens que temos em nossas mentes, que traduzem crenças gerais que temos sobre grupos de pessoas”. Não são necessariamente verdade, mas, sim, crenças que temos sobre categorias sociais. Esses estereótipos são muito importantes no desenvolvimento das crianças, já que influenciam a maneira como elas pensam umas sobre as outras. “Se uma criança acredita que meninas não são boas em matemática, ela tende a tratar as garotas como se não gostassem de números, calculadoras, aritmética ou robôs”, diz. O curioso é que, na maioria dos países, as meninas têm notas maiores do que as dos meninos nos primeiros anos da escola.
Apesar de não ter realizado nenhuma pesquisa específica na região, ele acredita que esse mesmo estereótipo negativo em relação a garotas e matemática existe no Brasil — e também na América Latina, de modo geral, e na Europa. “Sabe-se que há muito poucas mulheres em geral nos campos de ciência, tecnologia, engenharia e matemática, especialmente na altamente influente indústria das ciências da computação. Estereótipos e expectativas culturais podem levar a um número menor de mulheres na escola ou na universidade entrando em disciplinas que as preparam para carreiras na ciência da computação”, explica o psicólogo. Dessa forma, acabaremos com menos mulheres na indústria.
Mas por que, afinal de contas, é importante ter mais mulheres nos campos nesses campos e, especialmente, em ciência da computação? Para Andrews, há dois motivos principais. “O primeiro é a equidade social. Ciência da computação é um campo com muitos empregos lucrativos. Não é justo termos tão poucas mulheres neste campo. O segundo motivo é que o próprio campo será beneficiado ao trazer mais mentes criativas e brilhantes com outras perspectivas”, opina. “Ao trazer mais mulheres e minorias subrepresentadas no campo, podemos melhorar os tipos de jogos criados, os tipos de software”, completa.
No vídeo a seguir, é possível assistir a palestra de Andrew Meltzoff em sua passagem pelo Brasil. Em sua fala durante o Simpósio Internacional de Ciência para Educação, que aconteceu nos dias 5 e 6 de julho, o pesquisador explicou como esteriótipos culturais influenciam a identidade do estudante e o aprendizado de disciplinas STEM. Vale o play:
No site do G1, é possível ler a entrevista completa com o especialista.