Pós-graduação: a chance de estudar exatamente o que te interessa

Jovem em biblioteca

Sempre gostei dos intervalos mais do que das aulas. Muito mais, na verdade. Na semana de jogos escolares, quando não tinha aula, não precisava nem de despertador pra me acordar. Não porque eu era um grande jogador, muito pelo contrário. Sempre preferi o skate ao futebol. Mas porque era justamente nesse rápido lapso do calendário que conseguia ver um dia útil passar sem me perguntar quantos dias faltavam para o final de semana.

Como resumiu o filósofo das ruas, Eduardo Marinho, o condicionamento escolar é feito para setorizar a alegria da criança e enquadrar o trabalho como sacrifício: “Você vai se divertir na hora do recreio!”. Nas salas de aula os alunos são passivos a todo o conhecimento ali congelado. Somos acostumados desde cedo a pouquíssima construção e muita reprodução de conhecimento. Até mesmo a produção textual, mãe de qualquer criação acadêmica, foi pasteurizada em técnicas de redação dissertativa.

Em resumo, apertamos freneticamente o botão verde da máquina copiadora sem nos perguntarmos qual o significado daquilo que estamos reproduzindo. Finalmente quando nos livramos da faculdade e entramos na vida profissional plena, toda essa doutrinação educacional deságua em uma rotina que repudia as segundas feiras e hipervaloriza as “horas livres”.

Esse santo graal é colocado como uma razão a mais para engolir o remédio amargo dos dias úteis, que cura nossa incapacidade de consumir com satisfação tudo o que nosso tempo livre tem para nos oferecer.

E assim é dada a largada de uma corrida cíclica e selvagem que geralmente só desacelera quando a saúde ou razão falam mais alto. Infelizmente, geralmente é a saúde. O fato é que por mais que odiemos aquilo que fazemos, somos convencidos a ignorar que a maior parte da nossa vida acontece dentro dos dias úteis. São milhares de páginas não lidas, palavras não faladas e sentimentos ignorados. Tudo desprezado por que não conseguimos alinhar aquilo que nos motiva com aquilo que temos que fazer. A vida se encolhe pra caber nos dias de folga, enquanto no resto do tempo apenas fingimos estar vivos.

A pós graduação

Se você se identificou com o cenário descrito até agora, não desista. Vou propor uma saída, literalmente.

Quatro anos após eu ter me formado em engenharia, eu já estava enterrado figurativa e literalmente no meu trabalho, tocando a implantação de uma nova estação subterrânea do metrô de São Paulo. Antes disso também trabalhei em uma fábrica de trens, oficinas de manutenção de vagões e também em alguns outros projetos que sinceramente me dão orgulho de ver os resultados até hoje por ai. Mas no meio de tantos dias e noites exaustivamente trabalhados, acabei perdendo o sentido original que me levou a trabalhar ali. A corrida me engoliu de tal jeito que me sentia de volta ao período escolar apenas aguardando a hora do intervalo.

Graças à influência de alguns amigos, minha irmã e principalmente da minha esposa, observei um fenômeno curioso da nossa vida acadêmica. Passamos a vida inteira estudando muitas coisas que não escolhemos, simplesmente porque são itens obrigatórios da grade curricular, seja ela qual for. Finalmente quando chegamos ao clímax do nosso poder decisório sobre o que iremos estudar, ou seja, na pós-graduação, geralmente o que fazemos? Aquilo que dá mais dinheiro, claro. Ou simplesmente não fazemos nada, apenas continuamos trabalhando.

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Apesar de óbvio, demorou alguns anos para me cair a ficha que a pós-graduação era a peça que estava faltando para reorientar minha carreira em uma direção que pudesse novamente alinhar significado e trabalho. Foi então que decidi começar a me preparar para voltar aos estudos. Esse processo durou aproximadamente 1 ano. Entre a escolha exata do curso, preparação de documentos, TOEFL, cartas de motivação, cartas recomendação, processos seletivos de bolsas, enfim, é uma longa jornada. Mas com dedicação e perseverança, uma hora a nossa vez chega. Finalmente fui aceito pra fazer meu PhD.

Desde que iniciei essa jornada de pós-graduação, há pouco mais de 4 meses, tenho percebido que os dias úteis tem tido um novo significado. Assistir aulas, dar aulas e fazer pesquisa hoje são meu trabalho, mas também são meios de me envolver com temas que realmente me fascinam diariamente. É até estranho pensar que tudo que já vivi nessa fase até agora durou tão pouco tempo. Mas tenho pra mim que isso é apenas mais um indicador que quando as memórias estão mais vivas, é porque estamos na trilha certa de uma velhice satisfeita e em paz.

Sem dúvida a saída que encontrei não é a única, nem se aplica a todos. Mas o que percebi nesse caminho é que para se ressignificar uma rotina, mudanças estruturais são necessárias. Uma mudança de cenário pode ajudar, mas não significará nada se a atitude e perspectiva da vida também não mudarem. Quando transformamos competição em colaboração, raiva em aprendizagem, arrogância em solidariedade é certo que damos um passo a mais a caminho de dias realmente úteis.

Rodolfo Benevenuto

Colunista do Estudar Fora, Rodolfo se formou em engenharia elétrica pela Poli USP, fez MBA em Gerenciamento de Projetos pela FGV-SP e após 7 anos trabalhando na área metro-ferroviária decidiu reorientar sua carreira. Hoje faz PhD em Engenharia de Transportes na Trinity College Dubin. Sua pesquisa enfoca o tema da redução da pobreza extrema nos países latino americanos por meio do desenvolvimento dos transportes. É bolsista do ano de 2016 da Fundação Estudar e também participa do programa League of Students como estudante embaixador compartilhando sua experiência de estudar fora.

Coluna originalmente publicada no portal Estudar Fora.

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