O engenheiro carioca Cauam Cardoso, hoje doutorando em Desenvolvimento Internacional no MIT (Massachussetts Institute of Technology), foi o ponto fora da curva na família. Com pais e irmãos ligados às artes, da dança profissional à música, ele escolheu outro caminho: o da engenharia. E, logo de início, este pareceu um caminho arriscado.
Cauam desde pequeno se dava bem em matérias ligadas às Humanidades na escola, e não tinha uma facilidade absoluta com os números. Como ele mesmo reconhece, entretanto, sua trajetória tem a ver com escolher “o caminho mais difícil” e desafiador – mesmo que isso signifique suar a camisa desde a graduação.
O ponto em comum entre a formação de Cauam e a do restante da família era o interesse por problemas sociais e pela vontade de combatê-los. Combinando esse aspecto à vontade de se desafiar na engenharia, ele acabou saindo do Rio de Janeiro e indo para a Universidade Federal de Santa Catarina para estudar a área ambiental e de saneamento. “A engenharia me deu a chance de contribuir para a justiça social”, diz Cauam.
Eu tive mais facilidade nas aulas, porque percebi o motivo pelo qual eu estava aprendendo tudo aquilo na faculdade
Esse impulso por trazer a engenharia para problemas sociais complexos fez com que, ainda na graduação, ele se unisse a um colega para desenvolver um projeto na Favela da Serrinha, em Florianópolis. A proposta incluía pensar projetos para saneamento na comunidade, bem como o manejo de resíduos sólidos na região.
Ele e outros integrantes do projeto, que durou quatro anos, também passaram a realizar atividades sobre educação ambiental para os moradores. Foi um dos pontos decisivos para Cauam. “Tudo mudou pra mim. Eu tive mais facilidade nas aulas, porque percebi o motivo pelo qual eu estava aprendendo tudo aquilo na faculdade”, conta ele.
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Desafios ambiciosos
Uma vez formado, o engenheiro ambiental planejava trabalhar em outros países, e um dos focos era a África. Vindo de uma família birracial, em que suas origens remetiam ao continente, Cauam procurou por meses uma oportunidade de atuar por lá. Sua primeira parada foi um posto ligado ao governo de Angola.
“Como era um país que passou muitos anos numa guerra civil, estávamos lá para ajudar a reconstruir o país”, detalha. Na época, a situação era desafiadora. Os engenheiros, como Cauam, se desdobravam para melhorar a coleta de lixo, cuidar dos resíduos em hospitais e impedir contaminações e doenças. “Mas o tamanho do desafio era também o tamanho da recompensa. Era muito gratificante”, reconhece ele.
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Cauam optou por, depois do período em Angola, aperfeiçoar o inglês. Passou quase quatro meses na Austrália, estudando o idioma, e em seguida se candidatou para o mestrado em Economia Política na Universidade de Sydney – o que lhe daria base para os estudos futuros. Foi essa base teórica, somada à prática em países africanos, que o levou ao Camboja.
Era mais um momento de ir a campo e ter contato com a vida de quem era afetado por seus projetos. “Se você me der uma planilha no Excel para analisar, eu vou adorar, mas depois de uns três meses vou ter que ir a campo”, explica. Ali, ele passou a trabalhar com uma área nova, voltada para segurança alimentar, junto à Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, que faz parte da ONU.
Entre os cálculos dos engenheiros e o planejamento de uma equipe inteira, havia alguma lacuna que impedia a realização na prática.
Com o trabalho desenvolvido nas Nações Unidas, Cauam passou a se atentar para o que se tornaria seu objeto de pesquisa: como algumas iniciativas e projetos pareciam tão bem planejados, mas falhavam na aplicação prática? Entre os cálculos dos engenheiros e o planejamento de uma equipe inteira, havia alguma lacuna que impedia a realização na prática.
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Engenharia aplicada à mudança
Depois de viver em seis países diferentes, e comparar projetos em áreas diversas, Cauam chegou a uma hipótese: o contexto social, as práticas diárias da população, os hábitos e traços culturais faziam a diferença.
Por exemplo, se um projeto será desenvolvido na Indonésia, país de maioria muçulmana, é necessário lembrar das datas importantes para aquela comunidade. Lá, a sexta-feira é um dia de congregação. “Se eu for dar uma aula numa sexta-feira, em um país muçulmano, vou precisar saber disso”, exemplifica Cauam.
Foi a ideia de unir aspectos sociais à análise sobre novas ferramentas e técnicas que levou Cauam ao MIT – onde recebeu a mais prestigiosa bolsa da instituição, a Presidential Graduate Fellowship Program. Hoje, ele se dedica a sistematizar, diante de exemplos históricos, como é possível verificar se uma iniciativa dará certo — ou seja, se um equipamento ou planejamento desenvolvido dentro de um escritório vai significar realmente melhorias para populações diversas.
Dedicando-se simultaneamente a dar aulas para graduação e mestrado no MIT, Cauam é categórico em falar da importância do contato com o campo para os engenheiros. “Se você não for a campo, vai ter uma noção completamente diferente dos elementos que compõem o seu trabalho”, aponta. Para formar melhores engenheiros – e mais preocupados com os contextos em que seus projetos se realizam, ele também destaca a necessidade de “exposição a matérias das ciências sociais”.
Esse conjunto, somado à possibilidade de viajar e conhecer contextos diferentes, é um ponto importante na formação do engenheiro. “Isso abre as fronteiras do possível”.
*Foto: Ian MacLellan
Artigo originalmente publicado no portal EstudarFora.org
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